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Instituições se diferenciam nos objetivos e relação com clientes. Segundo BC, Brasil tem 20,6 milhões de cooperados. Paraná teve salto de 92,4% no sistema e, atualmente, 23,46% da população é cooperada. Economista cita prós e contras de bancos e cooperativas de crédito
As cooperativas de crédito oferecem serviços semelhantes aos de bancos, mas as instituições se diferenciam pelo propósito e tipo de relação que possuem com os clientes.
Enquanto nas cooperativas eles são chamados de associados, participam das decisões e recebem as “sobras”, que são valores equivalentes aos lucros, nos bancos a gestão e a divisão de dividendos são concentradas nos acionistas.
Em contrapartida, por serem instituições menores e normalmente regionalizadas, as cooperativas não têm tantas agências e caixas eletrônicos. Em compensação, investem no atendimento personalizado e, segundo o Banco Central, por não visarem lucro, costumam contar com produtos e serviços em condições mais acessíveis, principalmente em linhas de crédito sem garantia e com taxas de juros menores. Saiba mais abaixo.
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Esses foram alguns dos motivos que fizeram a empresária Rosmery Dall Oglio Kostycz, de 58 anos, mudar a própria vida financeira e das duas empresas que administra.
Moradora de Ponta Grossa, nos Campos Gerais do Paraná, ela trocou o sistema bancário pelo cooperativismo de crédito primeiro como pessoa física e depois como pessoa jurídica.
A primeira questão que me chamou atenção é a qualidade do atendimento da cooperativa. As pessoas que trabalham lá têm não sei se um treinamento específico para isso, mas são muito próximas às pessoas, aos clientes. Isso, para o meu perfil, eu acho importante, porque a gente lida muito com tecnologia, só que nem sempre a tecnologia resolve os nossos problemas do dia-a-dia’
Rosmery faz parte dos mais de 10,3 milhões de brasileiros que decidiram experimentar o cooperativismo nos últimos sete anos – período em que, de acordo com o Banco Central, o total de associados de cooperativas dobrou no país.
O mesmo comportamento aconteceu no Paraná, que tem, de acordo com o Banco Central (BC), mais de 2,7 milhões de associados a cooperativas de crédito, o equivalente a 23,46% de toda a população.
Para entender o que motivou esse movimento, o g1 ouviu e buscou dados junto ao Banco Central, que supervisiona os dois tipos de instituições financeiras.
Nesta reportagem você vai conferir:
➡️ Diferenças entre bancos e cooperativas de crédito
➡️ Especialista indica prós e contras das instituições
➡️ Cooperativismo e papel social
➡️ Crescimento do cooperativismo no Brasil
➡️ Perfil dos associados
➡️ Qualquer pessoa pode ser uma cooperada?
➡️ Experiência na prática
Diferenças entre bancos e cooperativas de crédito
Tiago de Paiva Prota, assessor sênior do Departamento de Supervisão de Cooperativas e de Instituições Não-Bancárias do Banco Central (BC), explica que as principais diferenças entre as duas instituições são a forma com que os clientes – e cooperados, ou associados – são tratados.
Ele lista seis principais diferenças entre bancos e cooperativas de crédito:
Diferenças entre bancos e cooperativas de crédito
Resumidamente, os dois tipos de instituições podem ser categorizados como:
🏦 Bancos têm fins comerciais e devem ser constituídos sob sociedade anônima, o que significa que o capital social é dividido em ações. Além disso, os acionistas são os donos dos bancos e visam ao lucro.
🫱🏻🫲🏽 Cooperativas são sociedades de pessoas constituídas para prestar serviços aos associados, e os associados são os donos das cooperativas.
“Uma sociedade de capital tem os sócios, que são os acionistas, e uma sociedade de pessoas é feita para prestar serviço para essas pessoas. Então elas são, ao mesmo tempo, donas da sociedade e participam economicamente para prestação de serviço para elas mesmas. Esse é o conceito de cooperar”, detalha Prota.
Prota dá outros detalhes que evidenciam a diferença, como o caso das decisões internas, por exemplo. Nos bancos, decisões de gestão são tomadas pelos acionistas, que também dividem os lucros da instituição. Nas cooperativas, o poder é voltado aos associados, que participam de assembleias para discutir a gestão da instituição.
“Uma cooperativa não tem fins lucrativos e, portanto, ela não tem lucro ou prejuízo. Se o resultado for positivo, chamamos de sobra, e ela tem várias destinações. Uma parte significativa é dividida entre os cooperados, outra vai para a reserva prevista por lei (assim como nos bancos), e também há os investimentos sociais”, afirma Prota.
Outra diferença que se evidencia é em relação aos serviços oferecidos. Para o representante do Banco Central, as cooperativas conseguem atender a maioria dos consumidores. A participação do cooperativismo só é menor para megaoperações acima de R$ 100 milhões e modalidades específicas de exportação e importação, explica ele.
“Como as cooperativas não visam lucros, elas têm alguns produtos e serviços em condições mais acessíveis, principalmente em linhas de crédito sem garantia e com taxas de juros menores”, exemplifica.
Especialista indica prós e contras das instituições
Imagem ilustrativa
Divulgação
O economista e doutor em Desenvolvimento Rural Sustentável, Fernando Silva, elenca os prós e contras dos bancos e cooperativas:
Por parte dos bancos, o principal “pró” é a questão do tamanho da instituição. São instituições maiores, com atuação nacional, muitos até com atuação internacional e que, por serem instituições de grande porte, conseguem oferecer uma gama maior de produtos que buscam atender ao grande público.
A parte dos contras é que os bancos, por serem instituições com fins lucrativos, possuem taxas maiores, exigência de saldo mínimo, e isso acaba às vezes dificultando, por um lado, a vida do cliente.
Quando se trata das cooperativas, elas são instituições que pertencem aos cooperados, e o lucro é revertido justamente para que as taxas de juros sejam menores e o atendimento seja mais voltado para aquele público local.
Os contras da cooperativa ficam por conta da área de atuação. As cooperativas tendem a ter uma atuação mais regional, justamente por terem produtos mais desenvolvidos para públicos específicos, e se o cliente precisa de uma instituição com atuação mais nacional ou internacional, a cooperativa às vezes peca pela falta de agências ou de caixas eletrônicos.
Cooperativismo e papel social
O assessor sênior do Departamento de Supervisão de Cooperativas e de Instituições Não-Bancárias do BC destaca que, além das diferenças citadas anteriormente, existe uma forte conexão do cooperativismo com a parte social.
Prota exemplifica que, entre as destinações das sobras, está o Fundo de Assistência Técnica Educacional e Social (Fates), que é uma comunhão de recursos formada pelas cooperativas. O fundo é destinado à prestação de assistência aos associados, familiares, empregados da cooperativa e comunidade na qual ela está inserida e, por meio dele, cooperativas podem desenvolver programas de investimentos sociais voltados para educação e outras áreas.
“Tem uma relação muito grande com o poder da cooperativa de gerar desenvolvimento econômico regional. Num banco, o dinheiro depositado ali não fica naquela região necessariamente, ele muitas vezes vai para onde a sede está estabelecida, diferentemente das cooperativas.”
O Sistema Ocepar, que representa as cooperativas paranaenses, ressalta que o cooperativismo possui sete princípios básicos:
Adesão voluntária e livre;
Gestão democrática e livre;
Participação econômica dos cooperados;
Autonomia e independência;
Educação, formação e informação;
Intercooperação;
Interesse pela comunidade.
Em qualquer parte do mundo, independentemente dos regimes econômicos e políticos, as cooperativas seguem estes princípios na busca solidária de soluções para problemas comuns das pessoas “, aponta o Ocepar.
Crescimento do cooperativismo no Brasil
De acordo com o Banco Central, o cooperativismo de crédito vem crescendo em todo o país nos últimos anos – tanto em relação à quantidade de associados, quanto em relação à estrutura e representatividade das próprias cooperativas. Os dados estão no Panorama do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo, estudo anual do BC cuja última divulgação se refere ao ano de 2023.
Segundo o estudo, a quantidade de cidades com agências de cooperativas superou a quantidade de cidades atendidas por agências bancárias em 2023.
“Em 2023, enquanto 97 novos municípios passaram a ser atendidos por cooperativas, 32 municípios deixaram de ser atendidos por agências e postos de banco. Nesse contexto, a quantidade de municípios onde a cooperativa de crédito é a única alternativa presencial para obtenção de produtos e serviços financeiros cresceu, assim como nos anos anteriores, passando de 331 (dezembro de 2022) para 368 (dezembro de 2023)”, aponta o BC.
Os ativos totais de uma instituição financeira incluem não apenas a carteira de crédito, mas os outros bens. Enquanto que os ativos totais das cooperativas cresceram 23,9% em um ano (de 2022 a 2023), no mesmo período a alta no sistema financeiro nacional – que engloba os bancos – foi de 10,5%, segundo o BC.
Dados divulgados recentemente pelo BC também apontam que o total de associados dobrou em sete anos. Em agosto de 2018 o Brasil somava 10,2 milhões de cooperados, enquanto que no mesmo mês de 2024 o número saltou para 20,6 milhões.
No mesmo período, no Paraná, a alta foi de 92,4%. O estado fechou o período com mais de 2,7 milhões de associados a cooperativas de crédito, o equivalente a 23,46% de toda a população – ou seja, quase um a cada quatro paranaenses.
No estado, a cidade com mais associados em números absolutos é Curitiba, com 146,5 mil cooperados. Quando se olha para o total associados frente ao tamanho da população, Toledo fica em em destaque tendo 59,5% dos moradores cooperados. Confira no infográfico abaixo.
Perfil dos associados ao cooperativismo de crédito no Paraná
Gabriel Trinetto Pedrão/Arte RPC
Perfil dos associados
Em relação ao perfil nacional dos clientes de cooperativas, 3,2 milhões são pessoas jurídicas e 17,3 milhões pessoas físicas – sendo 56% homens e 44% mulheres. A maior parte (43,9%) tem entre 30 e 50 anos e criou conta entre um a cinco anos atrás (42,3%), de acordo com os dados do BC, referentes a agosto de 2024.
No Paraná, os mesmos dados mostram que o estado possui 2,7 milhões de associados a cooperativas de crédito, sendo 426,7 mil pessoas jurídicas e 2,3 milhões pessoas físicas.
56% são homens e 44% são mulheres, e a maioria (42,9%) tem entre 30 e 50 anos.
O padrão de tempo que a maioria dos paranaenses é associada a uma cooperativa também se repete à tendência nacional: 40,9% abriram conta no período de um a cinco anos atrás.
Qualquer pessoa pode ser uma cooperada?
Um dos principais mitos populares do cooperativismo de crédito é que as instituições são exclusivas para determinados setores e profissionais, como produtores rurais, advogados e médicos, por exemplo.
A lenda vem do histórico de regulamentações, já que apenas em 2003 o Banco Central permitiu que as cooperativas financeiras fossem de livre admissão.
Para o presidente do Sistema Ocepar, José Roberto Ricken, a liberação foi essencial para o crescimento das cooperativas.
“Tudo começou lá nos anos 1980. Naquela época nada podia, era uma uma legislação altamente restritiva, e hoje não. Hoje nós temos o próprio Banco Central apoiando, com regulamentos que permitem que o cooperativismo de crédito possa crescer. Qualquer pessoa hoje pode se cooperar numa cooperativa de crédito e participar do cooperativismo”, explica Ricken.
Experiência na prática
Empresária diz porque trocou sistema bancário por cooperativismo de crédito
Rosmery Dall Oglio Kostycz se tornou cooperada após ser convencida por pessoas conhecidas. O que começou como um experimento, se tornou primeira opção.
Hoje ela está associada ao Sicredi, que reunindo 51% dos cooperados de todo o Paraná (1,4 milhão de pessoas), atualmente é a maior cooperativa de crédito do estado, estando presente em 85% dos municípios e somando 480 agências.
“Eu acabei migrando para experimentar”, lembra.
Entre as vantagens oferecidas pelo cooperativismo de crédito, a empresária cita a divisão de resultados.
“Banco nenhum faz isso, os resultados ficam 100% pro banqueiro. […] Isso eu acho uma coisa muito bacana, porque daí você se sente parte integrante do processo. Eles têm uma gestão muito transparente através das assembleias que são realizadas, então você acompanha a movimentação da cooperativa, você acompanha os resultados, é tudo muito transparente. E isso é uma coisa que pra mim é importante”, comenta.
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