Teoria de que a realidade é uma simulação ganha fôlego na física quântica


E se a realidade não for nada mais do que uma simulação extremamente complexa? Em experimento controverso, pesquisadores testam essa possibilidade em laboratório. A Nebulosa do Anel, em registro do James Webb.
UNIVERSITY OF MANCHESTER
Um grupo de físicos liderado por Thomas Campbell, ex-cientista da Nasa, está investigando uma teoria que pode revolucionar a compreensão do universo: a hipótese da simulação, que propõe que a realidade pode ser uma simulação complexa.
A equipe de cientistas, que também inclui Farbod Khoshnoud, da Universidade Politécnica Estadual da Califórnia, em Pomona (CalPoly), está atualmente na vanguarda dessa teoria controversa. A hipótese é que o universo poderia funcionar como um videogame, gerando uma realidade “sob demanda” para observadores conscientes.
Experimento da dupla fenda
Tal hipótese, há muito teorizada por filósofos e popularizada pelo filme sucesso de bilheteria Matrix, de 1999, baseia-se numa interpretação não convencional da mecânica quântica, especificamente no famoso experimento da dupla fenda.
Nesse experimento, quando a luz é disparada através de duas fendas, observa-se um padrão de interferência, indicando que a luz age como uma onda. Entretanto, ao observar a luz com detectores, esse padrão desaparece, sugerindo que a própria observação afeta o comportamento das partículas. Em outras palavras, as partículas subatômicas parecem se comportar de forma diferente quando observadas, algo que tem intrigado os físicos.
Campbell sugere que esse fenômeno pode ser um de que a realidade só é “renderizada” no momento da observação, da mesma forma que um jogo de computador só gera as partes do mundo virtual que o jogador está vendo na medida em que ele joga.
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Experimentos para testar a hipótese da simulação
Para verificar essa hipótese, a equipe desenvolveu uma série de experimentos, descritos em seu artigo On testing the simulation theory, publicado em 2017 no The International Journal of Quantum Foundations, que são variações do experimento da dupla fenda.
“Duas estratégias podem ser seguidas para testar a teoria da simulação”, explica a equipe no artigo, também publicado no servidor de preprints eletrônicos arXiv. ” (1) Testar o momento da renderização; (2) Explorar requisitos conflitantes de preservação de consistência lógica e prevenção de detecção para forçar o mecanismo de renderização de RV a criar descontinuidades em sua renderização ou produzir um evento de assinatura mensurável em nossa realidade que indique que nossa realidade deve ser simulada.”
Num dos experimentos mais simples, eles propõem armazenar dados sobre a trajetória das partículas e os padrões que elas formam em pendrives separados e, em seguida, destruir aleatoriamente alguns deles antes que alguém veja os resultados.
Uma ampulheta.
Pexels
Se os padrões de interferência só aparecerem quando os dados da trajetória correspondente tiverem sido destruídos, eles argumentam que isso poderia indicar que a realidade está sendo gerada no momento da observação.
A equipe propôs outras versões mais complicadas do experimento, que estão disponíveis em seu artigo.
Consciência, um elemento essencial da realidade
De acordo com um comunicado recente, a teoria da simulação de Campbell difere do conceito de “simulação ancestral” proposto pelo filósofo Nick Bostrom, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, que formulou a hipótese da simulação. “Nossa hipótese difere da de Bostrom por considerar a consciência como um elemento essencial da realidade, e não como resultado da simulação”, diz Campbell.
“Se todos os cinco experimentos funcionarem como esperado, eles desafiarão a compreensão convencional da realidade e revelarão conexões profundas entre a consciência e o cosmos”, acrescentou o cientista especialista em física aplicada da Nasa e do Departamento de Defesa dos EUA.
Para financiar esses experimentos, Campbell criou uma organização sem fins lucrativos, o Centro para a Unificação da Ciência e da Consciência (Cusac, na sigla em inglês). Segundo um comunicado de imprensa, ele também arrecadou fundos por meio do site de financiamento coletivo Kickstarter para realizar a pesquisa.
Ilustração mostra a anã marrom mais próxima da Terra.
ESO-I. Crossfield-N. Risinger/via REUTERS
Teoria especulativa e controversa
É importante observar que essa teoria é altamente especulativa e controversa. Muitos físicos acreditam que há explicações mais plausíveis para os fenômenos quânticos que não exigem a suposição de que a realidade humana seja uma simulação.
Nesse sentido, é improvável que esses experimentos forneçam uma prova definitiva da hipótese. No entanto, há cientistas que persistem em suas pesquisas nessa área, como Melvin Vopson, da Universidade de Portsmouth.
Vopson explorou a possibilidade de que uma nova lei da física poderia sustentar a teoria do universo simulado, um conceito que chamou a atenção de figuras como Elon Musk. Esse campo, parte da física da informação, sugere que a realidade poderia ser composta principalmente de unidades de informação, semelhantes a bits. Numa pesquisa anterior, Vopson propôs que a própria informação possui massa e que as partículas elementares contêm informações sobre sua identidade, de forma análoga ao DNA humano.
Embora as teorias possam ser radicais demais para muitos, o mundo científico continua a observá-las com uma mistura de ceticismo e curiosidade. Independentemente do resultado, o que parece claro é que a pesquisa de Campbell capturou não apenas a imaginação dos cientistas, mas também do público em geral. E não é de se admirar: a ideia de que a realidade poderia ser uma simulação, que tem sido um tema recorrente na ficção científica, está finalmente sendo explorada nos laboratórios de física.
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