
Minuta de proposta que foi levada às lideranças prevê que líderes indiquem e destituam presidentes. STF agora exige que indicação dos recursos seja aprovada nos colegiados. Passado o Carnaval e de olho nas indicações de emendas, a Câmara dos Deputados deve focar nesta semana na discussão de uma nova mudança no regimento interno.
A principal alteração está na forma como os presidentes e vice-presidentes das comissões serão indicados: a ideia é que os líderes partidários sejam responsáveis por indicar os nomes que vão assumir o comando de cada colegiado.
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Edilson Rodrigues/Agência Senado
O poder do líder, segundo a minuta do projeto em discussão pelas lideranças à qual a GloboNews teve acesso, vai além: ele poderá destituir o parlamentar da presidência da comissão a qualquer momento, sem respeitar o mandato de um ano previsto atualmente.
🔍Hoje, o regimento exige que estes cargos sejam “eleitos por seus pares” e “com mandato até a posse dos novos componentes eleitos no ano subsequente”.
Atualmente, ainda que a liderança de cada partido sugira um nome, o parlamentar precisa passar por uma eleição interna em cada comissão para ser escolhido presidente. Se eleito, ele tem um ano de mandato na presidência ou vice-presidência da comissão.
As duas previsões são retiradas na proposta que está sendo discutida. A mudança, na prática, dá um “superpoder aos líderes partidários”, nas palavras de um deputado.
“Além da função de líder, ele será praticamente o próprio presidente da comissão, já que vai poder trocar o presidente a hora que quiser, se a condução estiver desagradando”, diz este parlamentar.
O texto final deve ser apresentado pela Mesa Diretora e votado pelo plenário da Casa. A ideia dos parlamentares é aprovar a proposta antes da instalação das comissões para o próximo ano, que deve acontecer nos próximos dias. Por isso, o projeto pode ser aprovado ainda nesta semana.
Pela minuta, presidentes de comissões como de Constituição e Justiça da Câmara poderão ser destituídos pelos líderes partidários.
Vinicius Loures/Câmara dos Deputados
Emendas são a razão
Segundo líderes partidários que participaram das discussões, a mudança vem após um “trauma” rondar a Cúpula da Câmara sobra a indicação da emendas parlamentares de comissões, que representam R$ 11 bilhões e não são divididas igualmente por cada parlamentar.
No fim do ano passado, o então presidente da Comissão de Integração Nacional, José Rocha (União-BA), escancarou uma manobra feita por líderes e pelo então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para que esses recursos fossem repassados às bases sem passar por aprovação nos colegiados.
A crítica de Rocha foi uma das motivações de uma nova suspensão das emendas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Além disso, na semana passada, o STF decidiu liberar os recursos com algumas condições – entre elas, que as emendas de comissão sejam aprovadas pelos colegiados. Por isso, os líderes e a Cúpula da Câmara querem garantir nomes de confiança no comando das comissões.
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Na justificativa da minuta do texto, a Mesa diz que, com as mudanças, “busca-se conferir maior relevância às decisões tomadas pelo Colégio de Líderes e valorizar o trabalho das Comissões”.
Contudo, reservadamente, alguns parlamentares veem com preocupação as alterações e dizem que dar tanto poder aos líderes nas comissões seria “acabar com esses colegiados”. Um líder disse “se estivesse no chão de fábrica, iria se insurgir” contra a proposta.
“Hoje, estou na condição de líder. Mas quando o projeto chegar ao plenário, basta um ou dois discursos na tribuna contra o texto, explicando o que ele faz e qual poder dá aos líderes, que acho que o plenário vai contra”, disse ele, sob reserva.
Outras mudanças
A proposta traz outras mudanças no regimento. Uma delas é a exigência de que projetos que tramitem em regime de urgência aprovado no plenário sejam votados em até 180 dias.
Na gestão de Arthur Lira, criou-se um costume de votar a urgência de projetos para agradar uma ou outra bancada, ainda que muitos projetos ficassem esquecidos.
Foi o caso, por exemplo, do projeto que equiparou o aborto acima de 22 semanas ao crime de homicídio, que teve sua urgência aprovada para agradar a bancada evangélica, mas nunca foi votado.
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Segundo a minuta apresentada por líderes, se um projeto com urgência não for votado em 180 dias, ele perde o regime e volta à tramitação normal.
Outro ponto que está em discussão é o fim da exigência de leitura da ata da reunião anterior nas comissões. A medida costuma ser utilizada por parlamentares que queiram atrasar a discussão de alguma proposta polêmica ou da qual discordem.
O texto também retoma a previsão, extinta em 2021, de suspensão das sessões da Câmara pelo presidente da Casa, desde que não se estenda para o dia seguinte. Na avaliação de alguns técnicos, a regra também se aplica às comissões e deve permitir que os colegiados suspendam a reunião no início da ordem do dia no plenário e a retomem à noite.
Embora tenham poder de mudar o rito de algumas matérias na Câmara, essas alterações foram chamadas de “cortina de fumaça” ou “perfumaria” por alguns líderes, que dizem que o objetivo fundamental com a proposta é modificar o formato da indicação das presidências das comissões.