Parosmia: entenda a doença rara que faz arroz, desodorante e até pessoas terem cheiro podre; ‘Pesadelo’, desabafa mulher diagnosticada


Ana Paula desenvolveu parosmia pós Covid-19 e até hoje, cinco anos depois, segue com o olfato alterado. Parosmia: entenda a doença rara que arroz, desodorante e até pessoas terem cheiro de podre
Já pensou se tudo ao seu redor não tivesse mais o cheiro que você conhece, mas um odor insuportável? Essa é a vida da dubladora Ana Paula Cadamuro. Desde 2020, tudo para ela tem cheiro de podre: da comida ao perfume que seu companheiro usa. Os médicos explicam que ela tem parosmia, uma condição em que o cérebro distorce o olfato e tudo passa a ter um cheiro desagradável.
👃 O cheiro começa no nariz, mas é processado pelo sistema nervoso. O corpo humano é capaz de identificar um trilhão de cheiros diferentes, compostos por várias moléculas, que entram no nosso nariz, e se unem a diferentes neurônios olfatórios.
Funciona assim:
O odor entra primeiro pelas narinas;
Depois, e chega ao topo da cavidade nasal, onde ativa o nervo olfatório.
Esse nervo envia uma espécie de “mensagem” ao cérebro, que então reconhece o aroma.
Os especialistas explicam que doenças virais, traumas graves no crânio ou na face podem causar lesões que afetam esse processo no sistema nervoso central, levando à parosmia. Com a condição, há uma distorção do cheiro real, que acaba sendo associado a odores desagradáveis.
Ana Cadamuro foi diagnosticada com parosmia, doença que distorce odor
Arquivo Pessoal
No caso de Ana Paula, o gatilho para a doença foi a Covid-19, que ela contraiu em 2020. Na época, perdeu o olfato e o paladar e, quando conseguiu voltar a sentir cheiros, nada mais foi como antes.
Ela conta que estava em casa fritando frango empanado quando sentiu um cheiro de comida estragada e achou que o produto estivesse fora da validade. Depois, o pão, o arroz e tudo ao redor passaram a ter um cheiro ruim.
Fui dormir com fome, mas acreditando que, quando acordasse, aquilo já teria passado. Mas foi o começo do pesadelo.
Ela começou a buscar respostas para o que estava acontecendo e relata que muitos médicos não acreditaram em sua queixa, já que são raros os casos em que a parosmia se prolonga por mais de um ano. No entanto, especialistas consultados pelo g1 explicam que isso é possível. E foi o que aconteceu com Ana.
A maioria dos casos é autolimitada, ou seja, tem um tempo curto de duração, que pode ser de semanas a meses. Mas há casos fora da curva. Com a pandemia, vimos alguns, e esse é um desses casos excepcionais.
Ana Paula Cadamuro é dubladora
Arquivo Pessoal
Cheiro de podre 24 horas por dia
Ana conta que um dos seus hobbies era cozinhar e que sonhava em participar de programas de culinária na TV, mas, desde que descobriu a doença, isso se tornou um pesadelo. Arroz, chocolate, café, queijo, pão: tudo tem cheiro de estragado ou podre.
Ela explica que quase tudo ao seu redor tem um odor ruim, semelhante ao de batata estragada – um cheiro que impregna o ambiente.
Durante esse processo, Ana deixou de comer muitos dos seus alimentos favoritos, perdeu o prazer pela cozinha e se viu limitada a uma pequena variedade de comidas.
“A comida tem um mau cheiro tão forte que já vomitei comendo um simples arroz. Você sente o tempo todo, mas não se acostuma, porque é ruim. E não é como se o cheiro fosse sempre igual, tem dias em que tudo parece pior”, explica.
Com isso, ela perdeu 40 kg, mas sem saúde. Já teve anemia diversas vezes e precisa tomar polivitamínicos e ferro, pois não consegue manter uma alimentação equilibrada.
Parosmia e Anosmia estão entre sequelas da Covid-19
O neurologista José Bauab explica que, quando o olfato é alterado, isso também afeta o paladar, devido ao retrogosto.
O paladar e o olfato têm nervos diferentes, mas o processamento desses sentidos é interligado. Assim, quando o olfato é alterado, o paladar também sofre mudanças.
Pessoas e ambientes também têm mau cheiro
O odor está sendo ativado o tempo todo. A casa, a cama, o escritório, os lugares têm seus cheiros característicos. No caso de Ana, até mesmo esses odores estão distorcidos.
Ela conta que essa é uma parte desafiadora da doença, pois, às vezes, o cheiro de uma pessoa se torna insuportável para ela, mesmo que essa pessoa esteja com a higiene em dia e tenha um odor considerado normal pelos outros.
“No Natal, fiquei no quarto sozinha porque a reunião de família estava levantando um mau cheiro que só eu conseguia sentir. Tive que adaptar minha vida a uma realidade inimaginável”, conta.
Ela explica que isso a fez ficar paranoica com os próprios odores. Com o calor dos últimos dias, seu maior pesadelo é não perceber se está com mau cheiro devido ao suor.
“Tenho lenços umedecidos e desodorantes espalhados por todos os lugares – no carro, no trabalho. Tenho medo de feder e nunca saber, de incomodar as pessoas”, conta.
Depois de se recuperarem da Covid, pacientes desenvolvem parosmia
Tem tratamento?
Os especialistas explicam que ainda não há estudos suficientes que comprovem um tratamento eficaz para a parosmia.
A maioria das pessoas recupera o olfato normal com o tempo. Para aqueles em que isso não ocorre, algumas das abordagens sugeridas incluem terapias olfativas, que tentam estimular a percepção dos cheiros naturais.
“É uma condição muito difícil, que vimos com maior recorrência na pandemia, mas que, infelizmente, ainda não tem um tratamento definitivo”, afirma José Bauab.
Ana já passou por vários médicos, mas ainda não encontrou uma solução para seu caso. Com o tempo, a única coisa que voltou a ter o cheiro natural foi o manjericão – algo que a ajuda com a alimentação. Cinco anos depois, ela tenta se adaptar ao que já aceitou ser sua nova realidade e faz acompanhamento psiquiátrico.
“Sinto falta de coisas simples, como o cheiro de uma pessoa ou comer um pão com mortadela. Nunca imaginei que isso pudesse acontecer. Tudo fede na minha vida”, desabafa.
Adicionar aos favoritos o Link permanente.

Os comentários estão desativados.