Laudos não identificam veneno e apontam ‘causa indeterminada’ em mortes de gêmeas no RS


Reportagem teve acesso com exclusividade aos documentos analisados pelo Instituto Geral de Perícias (IGP). MP afirma que mantém entendimento de que a mãe teria matado as filhas. Mulher está presa preventivamente. Túmulos de Manuela e Antonia, gêmeas de Igrejinha que morreram em intervalo de 8 dias
Reprodução/RBS TV
As perícias realizadas nos corpos das gêmeas encontradas mortas em um intervalo de oito dias em Igrejinha, cidade a 90 km de Porto Alegre, não identificaram veneno nos restos mortais das irmãs. O g1 e a RBS TV tiveram acesso, com exclusividade, aos documentos analisados pelo Instituto Geral de Perícias (IGP). A mãe das crianças, Gisele Beatriz Dias, é ré e está presa preventivamente.
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De acordo com o laudo pericial, Antonia Pereira e Manuela Pereira, de 6 anos, tiveram mortes de “causa indeterminada”. Os profissionais realizaram análise toxicológica em sangue e em material biológico, coleta de material papiloscópico, pesquisa de álcool, sêmen e venenos, além de exames histopatológicos – de células ou tecidos.
“O conjunto de dados não permite à presente perícia estabelecer a causa mortis”, pontuam os peritos sobre o caso de Antonia.
As análises realizadas nos restos mortais de Manuela Pereira após a exumação do corpo apontaram que as pesquisas de psicotrópicos e de veneno foram negativas. Um primeiro laudo, antes da realização do procedimento, indicava que a causa da morte teria sido insuficiência respiratória.
“Do examinado e exposto, conclui-se que, devido ao estado de putrefação do corpo, não há elementos para afirmar ou negar a existência de patologias que possam ter causado o óbito. A causa da morte resta indeterminada”, diz trecho do documento.
Gisele Beatriz Dias, mãe das gêmeas, virou ré na Justiça e é acusada de assassinato das filhas. A denúncia do Ministério Público (MP) foi aceita pela 1ª Vara de Igrejinha no dia 16 de janeiro.
O MP reafirmou que “mantém a mesma convicção [de responsabilidade de Gisele sobre as mortes], ainda que os laudos não tenham conseguido confirmar qual substância eventualmente foi utilizada”. (Veja a manifestação abaixo)
O g1 entrou em contato com o advogado José Paulo Schneider, que representa a ré, mas não obteve retorno até a mais recente atualização desta reportagem
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Arquivo pessoal
Análise em computadores, celulares e na casa
O trabalho de investigação do caso também incluiu a análise de computadores, celulares e chips, e da casa onde moravam as gêmeas. Veja abaixo as conclusões dos peritos:
HD, SSD e Pendrive: “No material periciado não foram encontradas evidências digitais relacionadas ao caso em tela”
Celulares, chips e cartão de memória: “Conforme resultados dos exames, não foram localizadas pesquisas nem conversas relacionadas com envenenamentos. Existem algumas pesquisas e conversas relacionadas com os termos de interesse identificados no ofício, cujos trechos foram transcritos no corpo deste laudo, mas nenhuma delas aparenta ter relação com o fato investigado”
Casa: “Não foram constatados vestígios de violência às vias de acesso, tampouco rupturas, desordem ou desalinhos significativos de coisas e/ou objetos, característicos de luta intensa ou de busca intensa no local”
Acusação do MP
A denúncia coloca Gisele como única responsável por um duplo feminicídio, que geralmente é categorizado assim em crimes no contexto de relacionamentos afetivos. A ré responde, também, por meio cruel, outra qualificadora que aumenta a pena em caso de condenação.
Para a Promotoria, os assassinatos “foram praticados contra mulher, por razões e condições do sexo feminino, em situação de violência doméstica e familiar, por ascendente contra descendentes, e, ainda, contra menores de 14 anos de idade”.
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Provas da polícia
O inquérito que apurou o caso das gêmeas traz como um dos indícios um relatório de buscas enviado pelo Google à polícia após determinação judicial. A investigação foi concluída em 10 de dezembro.
Ele indica que a mãe das meninas fez buscas para descobrir se “veneno de rato é capaz de matar um ser humano”.
As pesquisas, segundo o inquérito, teriam sido feitas nos dias 10, 11 e 12 de janeiro de 2024 e depois apagadas do celular. As gêmeas foram encontradas mortas em 7 e 15 de outubro do mesmo ano.
O sumiço repentino do registro de uma câmera de segurança que registrava o movimento da casa também é elencado como comportamento suspeito da mulher. Segundo o inquérito, Gisele disse ao marido que, dias antes da morte da primeira menina, um bandido furtou da casa dinheiro, devolveu no dia seguinte, mas levou consigo o cartão de memória que guardava as imagens.
O delegado entendeu que isso foi “uma conveniente maneira de Gisele não ter suas ações filmadas no local enquanto seu marido trabalhava fora nos dias imediatamente anteriores à morte de Manuela”.
Relembre o caso
Manuela Pereira foi encontrada desacordada em casa, onde estava com a mãe, em 7 de outubro. Ela foi levada para o hospital, onde já chegou morta. A suspeita inicial era de infarto.
Oito dias depois, em 15 de outubro, Antônia Pereira foi encontrada também desacordada em sua cama, onde antes estava dormindo. O Corpo de Bombeiros atestou o óbito no local.
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A partir do segundo caso, a polícia suspeitou do comportamento da mãe. Os indícios foram reforçados após um médico relatar que ela falou ter “ideias perversas” em relação às filhas durante o período em que esteve internada na ala psiquiátrica para tratamento de um quadro de depressão profunda, semanas antes das mortes.
O depoimento do profissional de saúde levou a polícia a pedir a prisão temporária da mãe, que foi detida enquanto prestava depoimento em 15 de outubro.
Além do médico, o depoimento da filha mais velha de Gisele, irmã das gêmeas, também reforçou as suspeitas da polícia. Ela disse que a mãe seria “plenamente capaz” de matar as irmãs.
Gisele segue presa, agora preventivamente.
Nota do Ministério Público
O Ministério Público do Rio Grande do Sul mantém a mesma convicção, ainda que os laudos não tenham conseguido confirmar qual substância eventualmente foi utilizada.
As razões de fato e de direito constam perfeitamente explicitadas na denúncia, que contém uma série de outros elementos veemente e fortemente comprobatórios das mortes violentas, dolosa e intencionalmente provocadas. Para o MPRS não há dúvidas da prática criminosa.
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