Seis anos após tragédia da Vale em Brumadinho, Minas Gerais tem mais de 40 barragens em nível de alerta ou emergência


Barragem de Córrego do Feijão se rompeu em 25 de janeiro de 2019, causando 270 mortes. Três vítimas seguem desaparecidas, e caso ainda não foi julgado.
Seis anos após a barragem de Córrego do Feijão, da mineradora Vale, se romper em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, causando 270 mortes, Minas Gerais abriga 43 estruturas em nível de alerta ou de emergência, segundo dados da Agência Nacional de Mineração (ANM). O número corresponde a 42% do total de barragens nessa situação em todo o Brasil (102).
Em MG, as estruturas em risco estão distribuídas em 19 municípios, principalmente da Região Central.
São eles:
15 barragens em nível de alerta: quando detectada anomalia que não gera risco imediato à segurança, mas que deve ser controlada e monitorada, entre outros critérios;
22 em nível de emergência 1: quando a barragem está com categoria de risco alta, entre outros critérios;
4 em nível de emergência 2: quando a barragem tem uma anomalia não controlada, entre outros critérios;
2 em nível de emergência 3: quando a ruptura é inevitável ou está ocorrendo, entre outros critérios.

As duas barragens em situação de maior gravidade são Forquilha III, da Vale, em Ouro Preto, na Região Central do estado, e Serra Azul, da ArcelorMittal, em Itatiaiuçu, na Grande BH. A primeira armazena 19,4 milhões de m³ de rejeitos de mineração. A segunda, 5,02 milhões.
Ambas foram construídas pelo método a montante, como as que colapsaram em Brumadinho e Mariana. Nesse tipo de estrutura, os alteamentos, em forma de degraus, são feitos com o próprio rejeito depositado.
“Barragens e pilhas de rejeito, atualmente, são a nossa maior preocupação, especialmente as barragens que estão em algum nível de alerta ou de risco, mas também as que não estão, por causa das chuvas extremas. A maioria dessas estruturas não tem o dimensionamento adequado para suportar essas chuvas intensas que a mudança climática vem trazendo”, afirmou o especialista em conflitos ambientais da mineração e professor do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG), Daniel Neri.
Barragem Forquilha III, em Ouro Preto.
Divulgação/Vale
Depois das tragédias em municípios mineiros, a construção e o alteamento de barragens de mineração a montante foram proibidos no Brasil.
A lei federal 14.066, de 2020, estabeleceu 25 de fevereiro de 2022 como data final para a descaracterização de estruturas desse tipo. No entanto, esse prazo não foi cumprido.
Em Minas Gerais, segundo o Ministério Público Estadual, 19 foram descaracterizadas, isto é, deixaram de exercer a função de barragem.
O processo de outras 35 ainda está em andamento, inclusive das duas em situação de maior emergência – o da Forquilha III só deve ser concluído em 2035, e o da Serra Azul, em 2032.
Brumadinho, 6 anos depois

A barragem da Vale se rompeu no dia 25 de janeiro de 2019 e despejou 12 milhões de m³ de rejeito em instalações da empresa, comunidades e no Rio Paraopeba.
Ao todo, 270 pessoas morreram na tragédia. Três seguem desaparecidas até hoje:
◾ Maria de Lurdes da Costa Bueno, de 59 anos, que passava as férias com a família em uma pousada soterrada pela lama;
◾️ Nathália de Oliveira Porto Araújo, de 25 anos, estagiária da Vale que estava no horário de almoço, conversando com o marido por telefone, no momento do colapso da estrutura;
◾ e Tiago Tadeu Mendes da Silva, de 34 anos, engenheiro mecânico recém-formado que tinha sido transferido para a mina em Brumadinho cerca de 20 dias antes da tragédia.
Maria de Lurdes da Costa Bueno, Nathália de Oliveira Porto Araújo e Tiago Tadeu Mendes da Silva
Arquivo pessoal
Seis anos depois, o Corpo de Bombeiros mantém as buscas pelas vítimas ainda não encontradas.
Os militares atuam com o apoio de estações de busca, que processam o material recolhido por máquinas e separam os fragmentos maiores dos mais finos. Os bombeiros são treinados para inspecionar visualmente tudo o que passa pelas esteiras e, desde o fim do ano passado, contam com a ajuda de inteligência artificial nesse processo.
“O bombeiro, obviamente, tem que estar atento durante todo o momento. São 12 horas por dia, quatro estações de buscas funcionando ininterruptamente, e toda essa atenção é necessária para que em nenhum momento de distração se perca algum objeto de interesse. […] O objetivo do Corpo de Bombeiros é encontrar as três joias restantes”, afirmou o major João Paulo Ferroni.
Ao longo de 2024, a Polícia Civil, responsável pela perícia dos materiais, recebeu 20 segmentos humanos localizados pelos bombeiros na área de buscas. Desde a tragédia, foram 1.045. A maioria das análises já foi concluída – atualmente, 28 estão em processamento.
À espera de justiça
Há dois anos, em janeiro de 2023, Vale, Tüv Süd e 16 pessoas se tornaram rés no processo que corre na Justiça Federal sobre o rompimento da barragem em Brumadinho.
Segundo as investigações, apesar de ter conhecimento dos problemas da barragem, a consultora Tüv Süd emitiu declarações de condição de estabilidade da estrutura, com fator de segurança abaixo do recomendado por padrões internacionais. A mineradora teria ciência da situação e apresentado os documentos às autoridades.
Todas as pessoas físicas foram denunciadas por homicídio qualificado (270 vezes), crimes contra a fauna e flora e crime de poluição. Já Vale e Tüv Süd, por crimes contra a fauna e flora e poluição.
No entanto, em março de 2024, a ação criminal contra um dos denunciados, o ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman, foi trancada, e ele deixou de ser réu no caso. O processo segue agora com 17 alvos – 15 pessoas físicas e as duas empresas.
Rompimento de barragem da Vale em Brumadinho (2019)
Douglas Magno / AFP
De acordo com o Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), a maioria dos denunciados já apresentou defesa. O próximo passo é a análise dessas defesas e a designação de audiências de instrução e julgamento, ainda sem previsão de data.
Para Iracema Dias de Oliveira, que perdeu o marido, o trabalhador terceirizado Eliandro Batista de Passos, aquele 25 de janeiro de 2019 nunca acabou.
“Todos os dias são 25 de janeiro na minha mente, na minha casa, na minha família. […] O tempo passou, mas a dor não passa, a saudade não passa, a ausência não passa, a falta dele não passa, e a ausência de justiça também”, lamentou.
Iracema Oliveira perdeu o marido na tragédia da Vale em Brumadinho
TV Globo/ Reprodução
O que dizem as empresas
Barragem da ArcelorMittal em Itatiaiuçu
Globocop
Em nota, a Vale destacou “seu respeito às famílias impactadas pelo rompimento da barragem” e disse que “segue comprometida com a reparação dos danos”. Afirmou também que “colaborou com as autoridades” desde o início das investigações.
Em relação à barragem de Forquilha III, a mineradora falou que o projeto de engenharia para a descaracterização “foi protocolado nos órgãos que fazem este acompanhamento e a previsão é de que as obras sejam iniciadas em breve”.
Segundo a Vale, a expectativa é que, até o fim deste ano, a estrutura deixe o nível de emergência 3.
Já a ArcelorMittal, responsável pela barragem de Serra Azul, afirmou que a estrutura está desativada e não recebe rejeitos desde 2012. Disse, ainda, que todos os indicadores de segurança permanecem inalterados e são monitorados 24 horas por dia.
Vídeos mais vistos no g1 Minas:

Adicionar aos favoritos o Link permanente.

Os comentários estão desativados.