Em 20% dos municípios do Brasil, alunos do 5º ano da rede pública não sabem somar moedas de R$ 0,50 ou converter 1 hora em minutos


Notas do Saeb (prova com questões de matemática e língua portuguesa) foram divulgadas nesta quarta-feira (14) pelo Inep. Regiões Norte e Nordeste apresentam os índices mais preocupantes. estudar-matematica-enem
Divulgação
Em 1 de cada 5 cidades brasileiras, os alunos do 5º ano de escolas públicas (municipais, estaduais e federais) apresentaram médias baixíssimas nas provas de matemática do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 2023.
Eles não demonstraram habilidades importantes para o dia a dia, como:
💰somar moedas de R$ 0,25 ou de R$ 0,50;
⏰converter uma hora em minutos;
📏identificar um retângulo entre outros quadriláteros;
⌚ver o horário em relógios de ponteiro;
🧮reconhecer frações como partes de um todo;
✖️resolver problemas que envolvam as noções de “duplo” ou “triplo”.
➡️Os dados, divulgados nesta quarta-feira (14) pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), mostram que a maior parte dessas cidades é de pequeno porte e está nas regiões Nordeste e Norte. As únicas capitais que aparecem na lista do baixo desempenho são Natal e Porto Alegre.
De 0 a 10, alunos ficam no nível 3 de domínio da matemática
Segundo a escala de proficiência desenvolvida pelo próprio Inep, as médias do Saeb em matemática são classificadas em 10 níveis (nos mais altos, estão as melhores notas). Em 1.137 municípios, os estudantes de 5º ano da rede pública alcançaram, no máximo, 200 pontos, encaixando-se no patamar 3.
Isso significa que eles conseguem realizar apenas tarefas como:
determinar o horário final de um evento, se souberem a duração dele e quando começou;
fazer subtração de números decimais;
reconhecer quadrados, triângulos e círculos, por exemplo.
“Os resultados de aprendizagem de matemática no Brasil merecem destaque, porque são muito críticos. Já no 5º ano, vemos resultados muito fracos, que transbordam e se ampliam nos ensinos finais do fundamental e no ensino médio”, afirma Gabriel Corrêa, diretor de Políticas Públicas da ONG Todos Pela Educação. “Desde o começo da trajetória escolar, o ensino da disciplina é pouco priorizado.”
Como ‘sair do buraco’?
Katia Smole, diretora executiva do Instituto Reúna e ex-secretária da Educação Básica do MEC, enfatiza a importância de recuperar as perdas decorrentes da pandemia da Covid-19, quando as escolas ficaram fechadas por um longo período.
“Não basta retomar as aulas, em especial para os alunos do 5º ano. As redes precisam criar ações muito bem planejadas e sistêmicas para que os estudantes aprendam o que perderam durante a pandemia. Parte do motivo de os resultados não terem voltado, e olha que já não eram bons, vem daí”, diz.
Tanto Corrêa quanto Smole reforçam a importância de o governo federal desenvolver uma política nacional para o ensino da matemática. Atualmente, só há programas focados na alfabetização.
“Temos muitos elementos que apoiam essa possibilidade, como a Base Nacional Comum Curricular, um bom sistema de materiais didáticos e avaliação. Cuidar da formação dos professores também é importante [para haver melhora], diz Smole.
Quais as raízes do problema, além da pandemia?
A seguir, veja um resumo das principais dificuldades encontradas pelo Brasil no ensino de matemática:
🧑‍🏫 BAIXA ATRATIVIDADE: A carreira de professor não é atrativa no país, em geral, pela baixa remuneração e pelas condições de trabalho. Nos cursos de licenciatura em matemática, então, a procura por vagas é baixíssima, e a evasão é alta. Quando um aluno tem bom desempenho em cálculo, acaba migrando para carreiras com melhores perspectivas de mercado de trabalho, como economia, engenharia e ciências da computação. Existe um gargalo na formação.
E mais: com os baixos salários, o mesmo professor precisa dar aula em mais de uma escola. O ideal seria que ele ganhasse o suficiente para poder se dedicar integralmente somente a um colégio.
❌ QUALIDADE RUIM EM FACULDADES: O crescimento desenfreado do ensino à distância (EAD) foi um retrocesso na educação, segundo especialistas ouvidos pelo g1: está rebaixando o nível de formação de professores. Em geral, são graduações formuladas a baixo custo, com aulas gravadas e reproduzidas para um número ilimitado de alunos. O MEC vem limitando a abertura de cursos de licenciatura nessa modalidade.
⚖️ DESEQUILÍBRIO NA DISTRIBUIÇÃO DE PROFESSORES: Forma-se um ciclo. Os estudantes aprovados nas faculdades privadas entram, em geral, com uma defasagem nos conhecimentos básicos, provavelmente pela baixa qualidade do ensino médio público. ➡️ Têm acesso a um curso superior fraco. ➡️Após a formatura, enfrentam maior dificuldade para passar nos concursos públicos mais concorridos.➡️ São contratados como professores temporários, em escolas de pior estrutura.➡️ Ensinam alunos que já são mais socialmente vulneráveis e que, por tabela, continuarão recebendo uma formação escolar pior que a dos mais ricos.
Além disso, no sistema de concursos públicos, os professores efetivos com mais experiência adquirem o direito de escolher a região onde trabalharão. Por buscarem melhores condições de infraestrutura, transporte e segurança, por exemplo, acabam optando, em geral, por escolas mais centrais, que já têm melhores desempenhos.
✏️ PASTEURIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO: As estratégias de ensino-aprendizagem raramente são voltadas para a realidade de determinada escola ou região.
💰 DESIGUALDADE ECONÔMICA: Entram aqui nos três aspectos. Veja abaixo:
O processo de educação formal no Brasil é recente. A escolarização básica, no sistema público, passou a ser acessível para a maior parte da população após a década de 1970, gradualmente. Foi só na década de 1990 que a maioria chegou ao ensino fundamental 2.
Por quase 400 anos, o Brasil viveu um sistema escravocrata, que deixou uma estrutura social difícil de ser superada. No cotidiano escolar, há alunos que precisam se preocupar antes com a sobrevivência: alimentação, segurança e moradia, por exemplo.
A escolarização dos adultos que convivem com o aluno também influencia na facilidade de aprendizagem. Crianças que não têm como comprar livros ou que vivem em um grupo social no qual a escrita e a matemática não fazem parte do cotidiano terão menos facilidade do que as demais.
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O que é Saeb?
É uma prova de português e de matemática feita por alunos do 2º, 5º e 9º ano do ensino fundamental e por estudantes do 3º do ensino médio. No caso do 9º ano, para uma amostra específica, houve também questões de ciências da natureza e ciências humanas.
Saeb é diferente de Ideb?
Sim. O Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira (Ideb) é composto pelas notas do Saeb e pelos índices de fluxo escolar (aprovação/reprovação dos alunos).
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