De onde vem o dinheiro e quem fiscaliza? Entenda o que é o orçamento municipal e como ele é feito


Juntas, Ribeirão Preto e Franca projetam R$ 6,7 bilhões em gastos para 2025. Especialista em gestão pública tira dúvidas sobre a origem dos recursos e os principais princípios dos gastos de uma cidade. Vista aérea de Ribeirão Preto, SP
Reprodução/EPTV
Juntas, as prefeituras das duas maiores cidades da região, Ribeirão Preto (SP) e Franca (SP), terão despesas orçadas em R$ 6,7 bilhões em 2025, segundo projetos de lei aprovados este mês pelas Câmaras e que se baseiam em projeções de aumento de até 10,6% na arrecadação para o ano que vem.
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Um dos mais importantes instrumentos de gestão de um município, o orçamento não só faz uma relação estimada entre as receitas, baseadas na arrecadação de impostos e transferências, e despesas, com investimentos e gastos da máquina pública, mas, com os avanços legais e da administração pública ao longo dos anos, também se tornou uma ferramenta de participação política, uma maneira de as pessoas acompanharem e cobrarem tudo aquilo que foi colocado no papel.
“Os ganhos são mais institucionais e de cidadania, das pessoas se reconhecerem sujeitos de direitos inclusive com poder de decidir e fiscalizar o recurso que é de todos”, analisa o professor da USP especialista em gestão e políticas públicas, João Luiz Passador.
Qual é a origem dos recursos? O que uma Prefeitura pode ou não fazer com o dinheiro? A seguir, essas e outras perguntas são respondidas pelo especialista, à convite do g1.
Vista aérea de Franca, SP
Prefeitura de Franca (SP)
📃O orçamento municipal mudou ao longo dos anos?
O orçamento público que conhecemos hoje como Lei Orçamentária Anual (LOA) é resultado de transformações ao longo da história, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial e das reformas constitucionais.
No Brasil, segundo Passador, é nos anos 1950 que o orçamento começa a deixar de ser apenas uma ferramenta de gestão contábil para se transformar em um instrumento gerencial e político, tendo como prerrogativa o interesse público. É depois dos anos 2000 que alguns marcos legais como a Lei de Responsabilidade Fiscal levaram à configuração atual dos orçamentos municipais.
“As peças orçamentárias mais contemporâneas, especialmente aqui no Brasil a partir dos anos 2000, passaram de fato a ser mais elaboradas e mais responsáveis do ponto de vista do seu impacto social, do que simplesmente uma ferramenta de controle”, explica o professor.

📃Como é elaborado? Por que é preciso planejar?
A LOA é o projeto de lei discutido, votado e aprovado anualmente pelas administrações municipais, com as Câmaras, e que estabelece as receitas e despesas do ano seguinte. A elaboração sempre precisa ser pautada em prerrogativas estabelecidas por outras leis. As principais são:
Plano Plurianual: define estratégias e programas governamentais, segundo indicadores e metas, para um período de quatro anos. normalmente elaborado no primeiro ano do prefeito e permanece válido até o primeiro ano do gestor seguinte.
Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO): é a legislação que estabelece as principais regras para a LOA, como o equilíbrio entre receitas e despesas, prioridades de financiamentos e direcionamento de gastos entre Executivo e Legislativo, por exemplo. Também é votada anualmente, antes da elaboração do orçamento.
Lei de Responsabilidade Fiscal: estabelece parâmetros para os gastos públicos em âmbito nacional, como limite de despesas com folha de pagamento, entrega de contas saudáveis a sucessores e regras como a necessidade de haver uma fonte de financiamento correlata para cada aumento de gasto.
“O recurso é público, de interesse público, então você não só precisa deixar muito claro o que você quer e precisa fazer como também as formas de controle sobre a execução orçamentária, porque o dinheiro é do público, os governos não têm autonomia de fazer coisas que não sejam em nome do interesse público”, enfatiza Passador.
Além disso, existe uma série de princípios de administração pública que norteiam a lei orçamentária, entre eles:
legalidade;
não vinculação: deixar parte dos recursos flexíveis para realocação;
publicidade: todos devem ter acesso ao orçamento;
uniformidade: para que seja possível comparar com os orçamentos de outros anos;
responsabilização: para que seja possível saber quem foi responsável pelo planejamento, pela execução e pelo controle das contas públicas.
A LOA geralmente é votada no fim do ano pelo Legislativo, depois de ter sido apresentada pela Prefeitura, que obrigatoriamente realiza audiências públicas para obter sugestões da comunidade.
👆Em Ribeirão Preto, o orçamento previsto para 2025 é de R$ 5,1 bilhões, o que representa um aumento de 6% em relação a 2024. Em Franca, a arrecadação está projetada em R$ 1,6 bilhão, com uma alta de 10%. Nos dois casos, as leis já foram aprovadas pelos legislativos.

💲De onde vem o dinheiro gasto pelas prefeituras?
Cada município tem uma realidade de arrecadação diferente, mas, em termos gerais, a maior parte das fontes de receita vêm de repasses do governo federal e do governo estadual, enquanto o restante fica com as fontes próprias municipais.
“Começaram a transferir para os municípios e para os estados maiores responsabilidades, especialmente para os municípios, então melhorou um pouco, isso varia de região, de estado, mas na média brasileira uns 63% das receitas que chegam ao município são transferências do governo federal, uns 21% são de receitas próprias”, afirma o professor da USP.
De receitas externas, vindas do âmbito federal e estadual, as principais fontes de arrecadação de uma cidade são:
cotas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM)
cotas de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)
cotas do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA)
repasses do Sistema Único de Saúde (SUS)
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb)
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), entre outros.
De receitas próprias, as fontes mais importantes de receita são os tributos municipais, especialmente:
Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU)
Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN)
Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI)
Taxas de custeio de iluminação pública e coleta de lixo, entre outros
👆Em Ribeirão Preto, as chamadas receitas tributárias, ou seja, obtidas a partir da arrecadação de impostos como o IPTU, somam mais de R$ 2,3 bilhões, enquanto as transferências correntes, de onde saem os recursos do governo federal e estadual, somam R$ 1,7 bilhão, com destaque para cotas de ICMS, que representam quase a metade, e IPVA, com quase 20%.
👆Em Franca, as receitas tributárias e contribuições de melhorias somam R$ 487,2 milhões – 30% do total de R$ 1,6 bilhão – e as transferências correntes representam R$ 828,1 milhões – 51%.
📊Por que as receitas devem ser iguais às despesas?
A peça orçamentária estabelece os gastos de uma cidade na mesma proporção da disponibilidade de recursos financeiros que devem ser arrecadados no ano seguinte.
Por um lado, isso significa que todo o recurso disponível deve ser utilizado em prol da população. “A ideia é que, sendo um recurso público, ele tem que ser usado na sua integralidade.”
Por outro, o gestor deve tomar cuidado para não exceder os limites de responsabilidade fiscal e comprometer a capacidade de pagamento da administração pública.
“Se você começar a gastar muito mais do que arrecada, vai chegar uma hora que vai perder sua capacidade de fazer os pagamentos, em particular os obrigatórios, você tem que pagar salário de funcionário”, explica.
O equilíbrio na gestão também é essencial para imprevistos e situações emergenciais, como catástrofes climáticas. “Aí também há uma previsão constitucional de desvinculação, você pode remanejar de rubricas orçamentárias para melhor atender a situações não previstas.”
Prédio do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), no Centro de São Paulo.
Divulgação
📊Quais as regras para distribuição das receitas?
Todos os recursos arrecadados têm, por definição, a distribuição entre secretarias da administração direta, como saúde, gabinete e educação, por exemplo, e órgãos da administração indireta – em Ribeirão Preto, por exemplo, entidades como a Guarda Civil e a Fundação Dom Pedro II.
Por força de lei, áreas consideradas essenciais têm prioridade e percentuais mínimos garantidos na destinação das verbas, como a educação, para onde os municípios devem destinar ao menos 25% do que arrecadam.
“Naturalmente essas são atividades típicas de estado: a proteção à saúde, a valorização da educação, áreas que são fundamentais.”
Há também despesas obrigatórias como pagamentos de dívidas, salários, pensões e aposentadorias.
Nas duas maiores cidades da região, a saúde e a educação são as secretarias que mais recebem recursos no orçamento:
Ribeirão Preto: R$ 1 bilhão para saúde e R$ 879,8 milhões para educação
Franca: R$ 423,5 milhões para saúde e R$ 495,4 milhões para educação
🖊O prefeito pode modificar a destinação dos recursos?
Sim. É para isso que o orçamento dispõe de uma cota para créditos suplementares, que podem ser remanejados, desde que, entre outras regras, tenha uma justificativa, não comprometa o superavit das contas, e venha acompanhado de excedente de arrecadação ou anulação de outras dotações.
Em Ribeirão Preto e Franca, respectivamente, a previsão dessa margem de remanejamento é de 15% e de 20% em 2025.
“Se precisar ultrapassar esses limites ele precisa de uma autorização da Câmara Municipal sobre a despesa extra ou sobre o excedente nas rubricas discricionárias.”
👆Vereadores determinam a destinação de verbas?
O orçamento, por definição, é participativo e, ao menos em teoria, os vereadores são os representantes da população na hora de ajudar a definir a destinação de parte das receitas obtidas pelo município.
São eles que apresentam as emendas parlamentares, que são discutidas e aprovadas durante a votação da LOA e são utilizadas para garantir a realização de obras pontuais em bairros, ajudar entidades, entre outras demandas localizadas.
Há basicamente dois tipos de emendas parlamentares. São elas:
impositivas: são emendas que já dispõem de recursos garantidos no orçamento
propositivas: não têm garantia no orçamento e dependem da anulação de outras dotações
Em Franca, por exemplo, onde o orçamento para 2025 é de R$ 1,6 bilhão, R$ 16,6 milhões foram reservados pelos vereadores e 59 emendas parlamentares foram aprovadas.
Câmara de Franca, SP
Reprodução/EPTV
🔍Como é a fiscalização das contas?
A Câmara Municipal e o Ministério Público tem a prerrogativa de fiscalizar o Executivo, inclusive na realização do orçamento.
Além disso, a Prefeitura precisar, todos os anos, enviar relatórios para o Tribunal de Contas do Estado (TCE), responsável por aprovar, ou não, a execução orçamentária, bem como dar orientações com relação a problemas eventualmente encontrados.
Diante da lei, um gestor está sujeito, por exemplo, a responder por improbidade administrativa a depender de como lida com as contas municipais.
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