Conseguir o Benefício de Prestação Continuada tem levado brasileiros a fazer uma verdadeira peregrinação. O Jornal Nacional mostra o drama de um senhor de 76 anos. Burocracia e tecnologia são obstáculos para acesso ao BPC
Imagem: Reprodução/TV Globo
Conseguir o Benefício de Prestação Continuada tem sido um desafio para uma parte dos brasileiros.
Há uma semana, o Jornal Nacional mostrou o drama de um senhor de 76 anos que passava por essa situação.
Este mês, seu João atrasou o aluguel e depende de doações para comer.
Tudo começou quando ele não conseguiu receber o salário mínimo do BPC – Benefício de Prestação Continuada. É a única renda deste pedreiro, que nunca trabalhou com registro.
O INSS afirma que avisou, por mensagem ou ligação, mais de 500 mil pessoas que precisavam se inscrever no Cadastro Único do Governo Federal para não ficar sem o benefício.
Mas o seu João não tem telefone. Não sabe ler nem escrever.
Nós conhecemos o seu João na semana passada, numa agência do INSS em São Paulo. O atendente disse que o valor seria desbloqueado em até 3 dias e que o senhor de 76 anos deveria ir a um Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e se inscrever no CadÚnico.
O seu João saiu cedo de casa para fazer o cadastro no CRAS e pedir novamente o desbloqueio do BPC. Com tudo agendado, achou que conseguiria resolver o problema sem demora ou dificuldades. Mas não foi o que aconteceu.
Solteiro e sem filhos, o seu João contou com a ajuda do vizinho Leilson.
Eles ficaram duas horas esperando, até que os funcionários descobriram que o seu João tinha sido encaminhado pelo INSS para o CRAS errado.
“O seu cadastro não está no município de São Paulo, está no município de Osasco”, disse o atendente do INSS.
“Estão alegando que na hora que ele pediu a informação, eu falei Artur de Azevedo, que Artur de Azevedo é aqui em Pinheiros e lá é Artur Azevedo. Por isso, confundiu ali,” disse Leilson.
“Joga para cá, joga para lá. É desse jeito,” disse o seu João.
Mais de uma hora depois, o seu João chegou ao CRAS em Osasco, na região metropolitana, e foi atendido.
“Aqui o senhor vai colocar seu nome, tá? O seu endereço e a sua assinatura. É melhor o senhor pedir pra moça preencher,” diz a funcionária.
“Eu não sei ler,” explicou seu João.
“O senhor já frequentou a escola?” questionou a funcionária do INSS.
“Nunca”, disse o pedreiro.
Ele se cadastrou e recebeu orientações sobre o pagamento.
“Em 48 horas já é liberado o benefício, depois que faz o Cadastro Único,” explicou a atendente.
Nós resolvemos ligar no 135 – no número gratuito do INSS – para saber sobre o saldo. O seu João precisou de ajuda com a assistente virtual e também para conversar com a atendente, que disse que o dinheiro está liberado.
“No caso, o seu pagamento não está com bloqueio, não. O senhor fez a atualização do CadÚnico?” diz a atendente.
“Fiz, fiz hoje,” confirmou o idoso.
Como o seu João não movimenta a conta bancária, ele só vai conseguir receber na semana que vem.
“Deveria ser muito mais prático, né? O pessoal do INSS não fazer ele andar tanto assim,” diz seu João.
O especialista em gestão e políticas públicas da Fundação Getúlio Vargas concorda, principalmente porque o BPC é pago para pessoas vulneráveis.
“Precisaria ter alguém treinado para entender todo o processo de uso do Benefício de Prestação Continuada, de acesso ao benefício. Não dá para você abandonar essas pessoas. Essas pessoas cresceram sem tecnologia, viveram sem tecnologia e não vai ser agora que elas vão passar a dominar recurso tecnológico. É uma questão de civilidade, é uma questão de cidadania, inclusive,” explica o especialista.
De cidadania e também de respeito a um idoso ansioso para ter alguns momentos de alegria.
“Eu estou doido pra comer uma costela de vaca bem gorda, com batata, e tá demorando muito,” disse o aposentado.
O Ministério do Desenvolvimento Social declarou que os beneficiários fora do CadÚnico foram notificados por diversos meios, como o extrato bancário, a Central 135, a plataforma Meu INSS e mensagens de celular.
Segundo o ministério, quem estiver com o benefício bloqueado pode atualizar o cadastro no CRAS perto de casa.