Mauro Cid entrega Bolsonaro ao STF. Mas não escapa de contradição

O ex-ajudante de ordens Mauro Cid prestou ontem depoimento a Alexandre de Moraes no STFMontagem

Mauro Cid cumpriu, em depoimento à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, o que se esperava dele antes do início dos interrogatórios.

O ex-ajudante de ordens da Presidência confirmou o que disse na colaboração premiada assinada no STF no fim do ano passado, negou coação para contar tudo o que contou e em seguida colocou Jair Bolsonaro na cena do crime. 

O ex-presidente, sexto a depor, pela ordem dos interrogatórios, recebeu, sim, uma minuta golpista que previa, entre outras ações, a prisão de todos os ministros da Suprema Corte (e a de Alexandre de Moraes, numa versão mais enxuta), para aplicar um golpe de Estado no país. Bolsonaro, segundo Cid, não só leu como alterou o documento.

Era o que a Procuradoria Geral da República precisava para confirmar a denúncia que colocava o ex-presidente no centro da trama.

O relato foi feito por alguém que atuou como sombra de Jair Bolsonaro durante quatro anos de governo. Por quase oito horas, a sombra virou o centro das atenções durante o interrogatório – para desespero do ex-chefe e de outros seis denunciados perfilados no banco dos réus.

Só que, dessa vez, Cid estava diante dos desafetos. E dos advogados deles. Alguns dos melhores da banca. E eles anotavam atentos as contradições do delator.

A principal delas era um estranho apagão da memória sobre as circunstâncias em que disse ter recebido do ex-candidato a vice-presidente, general Walter Braga Netto, dinheiro em uma caixa de vinho com o objetivo de financiar a empreitada golpista. Os recursos, segundo ele, seriam doações de empresários do agronegócio dispostos a bancar os acampamentos golpistas em frente aos quarteis.

Mas Cid jurou que não sabia das intenções de outro núcleo da trama, os responsáveis por bolar um plano para matar, além de Moraes, o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e o vice, Geraldo Alckmin (PSB).

Durante boa parte do depoimento, Cid se esforçou para descrever uma profissão dos infernos. Uma espécie de pararraio de malucos que o procuravam para confirmar notícias falsas e pressionar o chefe a tomar o poder à força.

E que tinha como missão apenas fazer chegar as mensagens a uns e a outros, sem se preocupar com a gravidade do que era discutido.

Para ele, tudo parecia uma grande conversa de bar – é o que acontece, na versão do delator, quando fardados recém-saídos do governo se reúnem para tomar cerveja e guaraná e começam a discutir os rumos do país.

Moraes não parece disposto a engolir a versão. Os outros ministros da Primeira Turma, idem.

A bomba de Cid já foi lançada.

Ela acrescenta poucas novidades em relação à delação, mas confirma o que disse a sós com Moraes, o relator do inquérito.

Agora a versão será confrontada pelos outros réus e seus advogados.

De todos, é Bolsonaro quem terá mais dificuldade para negar que colocou, sim, as digitais na minuta descrita por seu antigo homem de confiança.

*Este texto não reflete necessariamente a opinião do Portal iG

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