Laudo do IML conclui que paciente torturado morreu por agressões e uso de 11 remédios; polícia indicia donos de clínica por homicídio


Jarmo Santana faleceu por ‘trauma abdominal’ e uso de ‘fármacos psiquiátricos’, diz perícia. Cleber Silva e Terezinha Conceição foram responsabilizados por morte. Antes, monitor Matheus Pinto havia sido indiciado e preso por tortura. Crimes foram em julho em Cotia. Paciente Jarmo Celestino de Santana aparece amarrado e torturado. Laudo do IML concluiu que ele morreu por causa das agressões que sofreu e dos remédios que foi obrigado a tomar na clínica
Reprodução
Laudo do Instituto Médico Legal (IML) concluiu neste mês que o paciente torturado numa clínica de terapia para usuários de drogas em Cotia, na Grande São Paulo, morreu em julho por causa das agressões que sofreu e dos 11 tipos diferentes de remédios que foi obrigado a tomar.
De acordo com o documento da Superintendência da Polícia Técnico-Científica, obtido pelo g1, Jarmo Celestino de Santana morreu em decorrência de “trauma abdominal” e do uso de “fármacos psiquiátricos”. Ele sofreu socos e pontapés e ainda tomou um composto com comprimidos chamado de “Danoninho” pelos funcionários. A vítima tinha 55 anos.
Por causa da conclusão do exame pericial, a Polícia Civil decidiu indiciar também o casal dono da Comunidade Terapêutica Efata pela morte do paciente. Os enfermeiros Cleber Fabiano da Silva e Terezinha de Cássia de Souza Lopes da Conceição foram responsabilizados por “homicídio doloso”. Os dois respondem ao crime em liberdade.
Vídeo mostra tortura
Paciente é torturado e morto em clínica na Grande SP
Antes do indiciamento do casal, a delegacia que investiga o caso já havia indiciado Matheus de Camargo Pinto, monitor da Efata, pela “tortura seguida de morte” de Jarmo. O funcionário da clínica chegou a filmar e compartilhar um vídeo nas redes sociais que mostra a vítima com os braços para trás, amarrados com corda, e presos a uma cadeira.
Nas imagens é possível ver outros quatro jovens rindo e zombando do paciente. Matheus ainda enviou uma mensagem de voz para uma pessoa confirmando ter agredido o interno: “Cobri no cacete” (veja vídeo acima).
Além da confissão, Matheus afirmou no seu interrogatório à polícia que teve a ajuda de outras pessoas para imobilizar Jarmo. Falou que Cleber e Terezinha o ajudaram a conter o interno. A defesa dos dois nega e alega que eles não viram nem participaram da tortura.
A polícia investiga se mais pessoas participaram do crime. Matheus disse que outras seis pessoas (sendo quatro agentes de remoção de pacientes de uma empresa terceirizada e dois monitores da clínica) participaram diretamente das agressões contra o paciente. Segundo ele, o grupo ainda deu remédios para o interno ficar calmo.
O monitor responde ao crime preso preventivamente por decisão da Justiça. Ele também é réu no processo que apura as responsabilidades pela morte de Jarmo. O julgamento do caso ainda não foi marcado.
O g1 não conseguiu localizar a defesa de Matheus para comentar o assunto até a última atualização desta reportagem.
Em outros vídeos gravados por Matheus, ele aparece rezando no local com mais internos antes do crime (veja acima também). Jarmo não aparece nas imagens.
Donos de clínica
Preso por torturar paciente grava oração com outros internos
Cleber e Terezinha ainda não foram denunciados pelo Ministério Público (MP). O 1º Distrito Policial (DP) de Cotia pretende concluir antes o inquérito sobre o caso. Até lá, decidirá se pedirá à Justiça a prisão do casal dono da clínica.
“Eles [Cleber e Terezinha] são responsáveis por ministrar os remédios que contribuíram para a morte de Jarmo e também são coautores das lesões no paciente por não impedirem o funcionário deles de agredir o paciente”, afirmou a delegada Marcia Ianotti, titular do 1º DP. “Quando terminar o inquérito, verei se cabe prisão para mais alguém.”
“Fiquei surpresa, pois eles nem imaginavam que deram emprego a um homicida. Mas respeito a posição da delegada”, disse ao g1 a advogada Terezinha Cordeiro de Azevedo, que defende Cleber e Terezinha Conceição. “Futuramente será devidamente comprovada a inocência do casal”, afirmou.
Se o MP e a Justiça concordarem com a posição da polícia, os donos da clínica podem ser levados a júri popular por homicídio.
Internação de paciente
Enfermaria da clínica onde paciente foi obrigado a tomar 11 remédios diferentes; ao lado foto no celular de um dos investigados mostra que Jarmo Santana tomou composto chamado de ‘Danoninho’
Reprodução
Jarmo havia sido internado na clínica em 5 de julho, quando foi levado à força para a Efata por funcionários a pedido da família dele. A morte do paciente acabou confirmada em 8 de julho, quando deu entrada ferido num hospital em Vargem Grande Paulista, outro município da região metropolitana.
Quem o levou ao hospital foram outros monitores da Efata. Jarmo apresentava diversas lesões de agressões pelo corpo e não resistiu aos ferimentos, segundo os médicos.
Matheus trabalhava como monitor da clínica havia duas semanas. Quando foi interrogado pelos policiais, confessou que bateu em Jarmo para contê-lo porque o paciente estava “transtornado psicologicamente” e em “surto”.
Conselho de Enfermagem
Comunidade Terapêutica Efata e um dos donos da clínica, o enfermeiro Cleber Fabiano da Silva
Reprodução/TV Globo
O Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP) também investiga se Cleber e Terezinha, que são enfermeiros, cometeram alguma infração ética e profissional em relação à clínica e ao próprio paciente morto.
As punições previstas, em caso de confirmação da infração são: advertência, multa, censura, suspensão temporária do exercício profissional ou cassação do exercício profissional pelo Conselho Federal de Enfermagem.
Segundo a Prefeitura de Cotia, a clínica de terapia era clandestina. Uma equipe da Vigilância Sanitária esteve no endereço, interditou o local e atestou que a clínica particular não tem nenhum tipo de autorização para funcionamento. Os donos alegam o contrário: de que estariam regularizados para funcionar.
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