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Caro(a) leitor(a),
Noite dessas, revisitando lembranças do meu Instagram, me deparei com um post de 2021 que tem o mesmo título desta coluna: Se eu morrer antes de você.
No post, conto a história de um bate-papo com meu filho no carro, quando ele ainda era pequeno e estávamos voltando de alguma de nossas muitas aventuras. Você já se deu conta de que a vida é um contrato silencioso entre nós e o tempo? Em um desses momentos que só o cotidiano nos proporciona, fizemos um pacto: quando um de nós morrer, quem ficar deve fazer uma festa para celebrar a vida do outro. Afinal, segundo ele, despedidas tristes não combinam conosco.
Acreditando piamente na ordem natural da vida, não cogito nada diferente disso — nesse caso, é a única perda aceitável. E este papo de hoje não é para falarmos de “desgraças”.
![Coluna Se eu morrer antes de você](https://static.ndmais.com.br/2025/02/istock-2155533465-800x533.jpg)
Você já se deu conta de que a vida é um contrato silencioso entre nós e o tempo? – Foto: Getty Images/ND
Decretamos, então, que no dia da minha partida, quero que a despedida seja uma celebração. Música boa, luzes, risadas embriagadas de saudade e, por favor, comida e bebida fartas.
Ao começar a escrever a coluna de hoje, depois de reler esse post, lembrei-me de um filme que adorei, daqueles que me fizeram chorar litros: Como Eu Era Antes de Você. O filme toca em uma ferida delicada: a autonomia sobre a própria despedida. Will Traynor, interpretado por Sam Claflin, é um jovem cheio de vida que, após ser atropelado por uma moto, se vê aprisionado em um corpo que já não lhe responde. Ele opta pela eutanásia, uma decisão que, no filme, levanta questionamentos profundos sobre liberdade de escolha e o significado da dignidade.
A mesma escolha foi feita recentemente pelo poeta e acadêmico Antônio Cícero, que, ao ser diagnosticado com Alzheimer, decidiu partir antes que a doença lhe roubasse a consciência de si.
Mas este artigo não é uma defesa da escolha de Will ou de Cícero. Não se trata de um manifesto sobre a morte, e sim sobre a vida. Sobre como cada um de nós tem sua maneira de vivê-la e, talvez, de encerrá-la. No fim, o que realmente importa é ter histórias para contar e lembranças que mereçam ser revividas.
A morte é a única certeza que temos, mas nunca estamos realmente preparados para ela. Muitas vezes fugimos desse pensamento — na juventude, até morremos de medo dela —, mas, com o passar dos anos, ela se torna motivo de reflexão.
Mário Lago dizia que a vida é um contrato com o tempo e que, no dia em que o tempo cobrasse, ele pagaria sem reclamar. Seu velório foi uma celebração, com música e cerveja, e centenas de fãs e amigos passaram por lá para se despedir.
Se eu morrer antes de você, lembre-se: não quero lágrimas em silêncio, mas gargalhadas que ecoem, assim como na música de Noel Rosa, Fita Amarela, de 1933, eternizada na voz de Nelson Gonçalves, que diz:
Quando eu morrer
Não quero choro, nem vela
Quero uma fita amarela
Gravada com o nome dela
Não quero flores
Nem coroa com espinho
Só quero choro de flauta
Com violão e cavaquinho
Porque a gente leva da vida a vida que a gente leva. E, se a minha é uma “festa”, nada mais justo do que sair de cena com os acordes certos.
E você? Já pensou na sua despedida?
Porque, no fim, o que importa não é apenas como vivemos, mas como queremos ser lembrados.