Ex-secretário de Agricultura morre com diagnóstico de doença rara similar ao ‘mal da vaca louca’ no ES


Joel Santos da Silva, conhecido como “Faustão”, ficou internado há cerca de três meses e morreu nesta quarta-feira (15). Certidão de óbito aponta doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ). Joel Santos da Silva, de 67 anos, conhecido como João Faustão, morreu com suspeita de Doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ), similar ao mal da vaca louca..
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O ex-secretário municipal de Agricultura de Viana, na Região Metropolitana, Joel Santos da Silva, morreu nesta quarta-feira (15), em Cariacica, na Grande Vitória. O laudo da morte de Joel Faustão, como era conhecido, apontou doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ). Apesar de ser confundida com o ‘mal da vaca louca’, a doença não está relacionada com o consumo de carne bovina.
Segundo os médicos, DCJ é uma condição neurológica rara e sem cura, que na grande maioria dos casos acomete pacientes de maneira esporádica, ou seja, sem padrão de transmissibilidade reconhecível.
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A doença exige notificação compulsória para investigação de sua origem pelos órgãos de saúde, o que foi feito, segundo a Secretaria de Saúde (Sesa/ES).
A secretaria informou que “não há registros da doença da Vaca Louca em humanos no Espírito Santo. Em relação ao paciente com suspeita da doença, a Sesa colheu material para exames para dar suporte a investigação do caso pelo Ministério da Saúde”.
‘Ficou internado, não voltou mais pra casa’
O g1 conversou com um sobrinho de Joel, o jornalista Pedro Amâncio, que explicou como os primeiros sintomas começaram a se apresentar e como a condição do tio evoluiu rápido nos últimos meses.
“Há cerca de 90 dias, ele começou a perder as forças da perna, cair, e também com problema de insônia, dores de cabeça, sintomas persistentes. Os familiares começaram a procurar médicos, mas, um dia, ele agravou e foi levado para o PA de Viana, onde a médica que o atendeu bateu o olho e falou que era um problema neurológico e que precisaria ser encaminhado para um hospital”, contou Pedro.
Certidão de óbito de Joel Santos da Silva, de 67 anos, conhecido como João Faustão, que morreu com suspeita de Doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ), similar ao mal da vaca louca.
Arquivo pessoal
Neste mesmo dia, Joel foi levado para o Hospital Estadual Jayme Santos Neves, na Serra, na Grande Vitória. Entrou lúcido e conversando na unidade, mas, à noite, ficou bastante desorientado e foi entubado.
“Ele chegou andando, conversando de manhã, mas no final da noite, não falou coisa com coisa e entubou. Desde então ficou internado, não voltou mais pra casa. Às vezes esboçava reação, abria os olhos, depois piorava”, lembrou.
Segundo o sobrinho, durante os meses de internação no hospital Jayme, os médicos nunca pararam de investigar ou fazer exames. A primeira suspeita levantada e descartada foi Síndrome de Guillain-Barré. Depois, veio a menção à possibilidade de Encefalopatia Espongiforme Bovina (EEB), popularmente chamada de mal da vaca louca.
“Foram cruzando os dados e chegaram ao ponto de suspeitar da doença da vaca louca. Fizeram o exame 14-3-3, retiraram um líquido da medula espinhal dele e mandaram para São Paulo. Parece que é um exame tão complexo que só fazem lá. A previsão era sair o resultado em fevereiro, mas não deu tempo do meu tio esperar”, disse o sobrinho.
Mensagem compartilhada por familiares de Joel Faustão.
Redes sociais
Na última sexta-feira (10), depois de estar extubado há alguns dias, Joel foi transferido para o Hospital Estadual de Atenção Clínica (HEAC), em Cariacica, onde faleceu nesta quarta-feira (15).
“Apontaram doença priônica, que é essa DCJ, que dizem que tem os sintomas muito parecidos com os da vaca louca, mas não tem um laudo. Eles disseram que foi feito tudo e aplicadas todas as medicações possíveis, mas não teve jeito e veio a falecer. […] Um dia antes um padre esteve com ele para uma visita e fez uma extrema-unção. E na manhã da morte a minha tia esteve com ele também”, relatou Pedro.
Joel era casado e deixou dois filhos e cinco netos. Segundo familiares, ele tinha diabetes e acompanhava um problema cardíaco, mas era cuidadoso com a saúde e realizava caminhadas. O sepultamento ocorreu às 11h desta quinta-feira (16).
Joel foi líder comunitário no bairro Formate e era ainda filiado ao Partido Democrático Trabalhista (PDT). Também foi secretário de Agricultura na cidade de Viana, de 2013 a 2016.
Nas redes sociais, o ex-prefeito Gilson Daniel (Podemos), compartilhou a nota de falecimento de Joel Faustão e lamentou a perda: “Muito triste. Um amigo, foi meu secretário de Agricultura”, disse.
Movimentação no local onde aconteceu o velório do Joel Faustão.
Pedro Amâncio
Para a família, a morte veio como um descanso para o parente. Entretanto, mesmo agora, eles ainda vão esperar por resultados de exames para tentar entender o que houve.
“Acima de tudo, a morte do tio é um descanso, ele estava sofrendo muito no hospital, então por esse lado é um alívio, e a gente fica com a aceitação. Mas, por outro, a gente gostaria de ter uma resposta certa, para saber realmente o que foi. É só para a família entender o que houve, para saber se é algo que precisa ser monitorado, ou se tem risco para outro paciente”, disse o sobrinho.
O Ministério da Saúde foi procurado, mas não houve retorno até a publicação desta reportagem.
Até novembro de 2024, o Ministério da Saúde afirmava que nunca houve registros de casos da EEB em território brasileiro e que a forma “clássica” da doença “jamais foi registrada no país em mais de 20 anos de monitoramento, o que impede a transmissão para humanos por via alimentar”.
Doença de progressão rápida e fatal
Modelo cérebro humano.
Getty Images via BBC
A médica neurologista Mariana Grenfell, explicou a diferença entre as duas doenças e o porquê das duas serem confundidas.
“As duas são doenças priônicas, ou seja, fazem parte de um grupo de doenças neurodegenerativas que afetam o sistema nervoso central de humanos e animais. São raras, progressivas e fatais, e, atualmente, não têm cura. A doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) é uma doença humana, enquanto a Encefalopatia Espongiforme Bovina (EEB) é uma doença que afeta bovinos”, explicou a médica.
Segundo a neurologista, o quadro é de deterioração cognitiva, rapidamente progressiva, com a expectativa média de vida após o diagnóstico de um ano.
“É como se fosse um quadro demencial, mas que progride muito rápido, acompanhado de alguns transtornos de movimento, como tremores, desequilíbrio, mioclonias, entre outros. […] A gente vê pacientes numa faixa etária de adulto jovem para idoso, de 55 anos até cerca 70 anos com esse diagnóstico. A prevalência é ligeiramente maior no sexo masculino, mas na prática vemos a mesma quantidade dos dois sexos. Como não tem cura, a gente trata a complicação e os sintomas associados, como os tremores, as escaras”, disse.
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Existem três formas conhecidas de DCJ: esporádica, hereditária e iatrogênica, sendo que, aproximadamente, 85% dos casos ocorrem de maneira esporádica e sem padrão de transmissibilidade reconhecível.
“Os casos esporádicos realmente são os mais prováveis. Não estão relacionados com a presença de doença em familiar, com consumo de carne, com possível viagem, padrão geográfico, nada. É realmente um padrão que não está reconhecido”, apontou.
Contaminação através da carne não tem casos registrados no Brasil
Há ainda a variante da doença de Creutzfeldt-Jakob (vDCJ), essa sim associada ao consumo de carne contaminada, mas, no Brasil, não existem casos documentados com essa via de transmissão, segundo a Dra. Mariana.
“Alguns estudos epidemiológicos e de caso-controle realizados no Reino Unido, onde a maioria dos casos de vDCJ foi registrada, indicam que o consumo frequente de produtos de carne bovina, especialmente aqueles que podem conter carne mecanicamente recuperada ou carne de cabeça, está associado a um risco aumentado para a doença. Além disso, a epidemia de EEB, nos anos 1980 e 1990, no Reino Unido, levou a uma exposição significativa da população ao agente infeccioso através da dieta. Mas não temos esses casos (por essa via de transmissão) documentados no Brasil”, indicou.
A médica lembrou que a DCJ é uma doença de notificação compulsória, ou seja, que precisa ser informada à Vigilância Sanitária para que haja o trabalho de fiscalização e investigação sobre o caso.
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