Artista plástico com deficiência auditiva reproduz pontos turísticos de Rio Preto em homenagem aos 173 anos da cidade: ‘Forma única de ver o mundo’


Adriano Nardim, artista plástico e deficiente auditivo, lançou duas obras em homenagem à Represa Municipal e à Basílica Menor de Nossa Senhora Aparecida, localizada no bairro Boa Vista. Adriano Nardim, artista plástico e pessoa surda, lança duas obras em homenagem à Represa Municipal e à Basílica da Boa Vista
Arquivo Pessoal
São José do Rio Preto (SP) celebra, nesta quarta-feira (19), 173 anos de história. Em homenagem à cidade, um artista plástico e deficiente auditivo reproduziu dois dos principais pontos turísticos em suas obras. Ele, que sempre teve uma relação de amor pelo município, decidiu expressar o sentimento de gratidão por meio das cores.
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Adriano Nardim, de 36 anos, retratou, em sua nova coleção, a Represa Municipal e a Basílica Menor de Nossa Senhora Aparecida, localizada no bairro Boa Vista. Ambas são consideradas cartões postais de Rio Preto.
Adriano, natural de José Bonifácio (SP), é deficiente auditivo desde o nascimento e encontrou na arte uma forma de se comunicar. Em entrevista ao g1, com o auxílio do tradutor Marco Giachetto, o artista recorda as primeiras lembranças de infância, quando ainda morava na zona rural e começou a usar galhos de árvore para desenhar.
“A arte nem sempre foi uma ferramenta de comunicação para mim. Ela surgiu na minha vida inicialmente como uma válvula de escape. Comecei muito novo a traçar desenhos na terra, com galhos de árvore. Ainda consigo ter essa memória”, conta.
Adriano Nardim, artista plástico e pessoa surda, lança duas obras em homenagem à Represa Municipal e à Basílica da Boa Vista
Arquivo pessoal
A arte se tornou o seu único meio de expressão, especialmente em um ambiente escolar que, segundo ele, não era adaptado ou preparado para uma pessoa com deficiência auditiva. Mesmo com a ausência de alguns recursos pedagógicos, Adriano desenvolveu esse dom de forma autodidata. Aos 14 anos, pintou sua primeira obra, intitulada “Maria Mãe”, e nunca mais parou.
Após sua primeira obra, aos 14 anos, Adriano foi matriculado em um curso de desenhos para iniciantes
Arquivo pessoal
Com o apoio da família, Nardim continuou aprimorando as próprias habilidades e, ao longo dos anos, passou a explorar novas técnicas, como design gráfico, edição de imagens, pintura digital e outros elementos da cultura pop e do pós-modernismo.
A arte, em sua vida, sempre foi mais do que uma paixão: foi uma maneira de se conectar com o mundo e de superar barreiras, especialmente aquelas criadas pela ausência de comunicação para deficientes auditivos.
🏙️ Fonte de inspiração
Adriano Nardim, artista plástico e pessoa surda, lança duas obras em homenagem à Represa Municipal e à Basílica da Boa Vista
Arquivo Pessoal
São José do Rio Preto sempre teve um papel significativo na vida do artista. Desde que foi diagnosticado com a deficiência, a cidade se transformou em um ponto de referência pelos tratamentos de saúde que ele recebeu ao longo dos anos.
No município, Adriano teve a oportunidade de ser o primeiro a colocar o implante coclear (dispositivo eletrônico que permite a reabilitação auditiva em pessoas com perda profunda). Foi também em terras rio-pretenses que ele encontrou o apoio emocional e social para sua trajetória artística.
O artista relembra com carinho suas primeiras visitas à cidade, quando ainda era criança.
“Eu nasci e cresci rodeado da mais pura natureza. Mas a Represa Municipal me emocionou pelo contraste que se formou na minha mente, que, na verdade, era a mais perfeita harmonia. O urbano e o natural estão tão envolvidos…”, comenta.
Na pintura inspirada na Represa Municipal, ele representa a água como o elemento central da composição, com dois aglomerados azuis que simbolizam os dois lados da represa, além de elementos que evocam a fauna e a flora. O quadro reflete a fusão entre a natureza e a urbanização, representando a força e a calma do local, que é icônico em Rio Preto (confira abaixo).
Outra grande inspiração de Adriano é a Basílica Menor de Nossa Senhora Aparecida, símbolo arquitetônico da cidade. A obra “Portal” é uma homenagem à igreja e sua grandiosidade, com pinceladas de cores quentes que remetem à força das colunas e à imponência do edifício.
A obra transmite o impacto visual que o artista sentiu quando, aos oito anos de idade, esteve pela primeira vez na Basílica.
“Eu me lembro de ficar quase o tempo todo em que estive ali com a cabeça erguida, contemplando cada detalhe. A basílica foi capaz de falar tudo o que eu não podia ouvir”, explica.
Nas redes sociais, o vídeo que mostra o processo de produção da obra alcançou 8.400 visualizações em menos de 24 horas.
Basílica foi um dos lugares de Rio Preto que ficaram marcados na memória de Adriano, desde sua infância
Reprodução/Instagram
🎨 Rompendo barreiras
Adriano também deu mais um salto ao divulgar sua arte na internet. Com o objetivo de torná-la mais acessível e aproximar-se de seu público, o artista passou a gravar vídeos de seus quadros, explicando, por meio da linguagem de sinais, sobre o processo criativo e compartilhando suas inspirações. Nesse caso, a mensagem é traduzida por um narrador, permitindo que todos ouçam as informações.
Os vídeos, postados em seu perfil no Instagram, também abordam questões importantes para a comunidade, como a inclusão e a acessibilidade aos deficientes auditivos. Desde o início de seu projeto digital, em fevereiro de 2025, Adriano já alcançou mais de 287 mil visualizações e ganhou aproximadamente 4 mil seguidores em sua conta.
No Instagram, os vídeos de Adriano somam centenas de visualizações e comentários
Reprodução/Instagram
Ele revela que, ao abrir a rede social, se deparou com o número impressionante de visualizações: “É surreal. São mais de 315 mil pessoas que me viram e que me entenderam. Esse retorno me empolga e me faz sentir pertencente a mais uma comunidade”, comenta o artista.
A produção de conteúdo artístico e social rompeu barreiras e também trouxe um impacto significativo na vida das pessoas que o acompanham. O artista recebeu mensagens de outros deficientes auditivos e de ouvintes, agradecendo pela acessibilidade em seus vídeos e relatando como as obras os tocaram.
🖼️ Inclusão
Adriano segue em busca de colocar novos projetos em prática. Uma de suas próximas coleções, intitulada “Quatro Estações”, trará quatro quadros representando cada uma das estações do ano. A outra coleção, chamada “Inanis”, será marcada pelo minimalismo, com obras que exploram ambientes vazios e tons mais frios, trazendo um toque bucólico e nostálgico.
Em sua carreira artística, Adriano já produziu mais de 200 obras
Arquivo pessoal
Ele também está com um projeto social em andamento, denominado “Oficina Ouvindo as Cores”. O objetivo é ensinar crianças sobre pintura, cores e técnicas artísticas, ao mesmo tempo em que aborda questões como inclusão e conscientização.
“A arte tem o poder de transformar, de romper barreiras. Eu acredito que, ao ensinar as crianças sobre as cores e a pintura, elas não estão apenas aprendendo a arte, mas também aprendendo a respeitar as diferenças e a valorizar a inclusão. A surdez não é uma limitação, mas uma forma única de ver o mundo, e é isso que quero compartilhar com elas”, afirma.
Com um olhar atento às oportunidades, Adriano sonha em criar seu próprio ateliê em Rio Preto, um espaço que vai simbolizar sua jornada de superação e conquistas.
*Colaborou sob supervisão de Henrique Souza
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