Primeiro diretor negro da FAAC relembra plano para extinção da população negra do Brasil e diz que gestão será focada no racismo


Professor doutor Juarez Xavier foi empossado nesta sexta-feira (22) na Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design (Faac) da Unesp em Bauru (SP). Jornalista já foi vítima de racismo nas ruas e no próprio ambiente acadêmico. Professor que já foi vítima de racismo no meio acadêmico é nomeado primeiro diretor negro da FAAC da Unesp de Bauru
Denilson Mônaco/TV TEM
Em 1911, durante o Congresso Universal das Raças em Londres, o representante brasileiro, João Batista Cabral Lacerda, afirmou que o objetivo do governo brasileiro era, em um período de 100 anos, extinguir a presença da cultura e da população negra do país.
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Um século depois, em 2011, o professor doutor Juarez Xavier ingressou na Universidade Estadual Paulista (Unesp), tornando-se, 13 anos mais tarde, o primeiro diretor negro da Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design (FAAC) da instituição.
Esse marco histórico foi o tema central de seu discurso de posse, realizado na sexta-feira (22), em uma cerimônia que contou com a presença de amigos e da reitoria da universidade.
“Eu tenho isso como um marco importante porque, logo depois, vieram as políticas de ação afirmativa, um ano depois do cálculo feito em 1911 para extinção da população negra”, contou o professor em entrevista ao g1.
Juarez é professor e sofreu racismo em universidade de Bauru
Carlos Henrique Dias/g1/Arquivo
Durante sua fala, Juarez também relembrou quantas personalidades marcantes o Brasil não teria se a declaração racista de Lacerda tivesse se concretizado.
“Se essa fabulação supremacista tivesse vigorado, nós não teríamos capoeira, futebol, Didi, Pelé, Baltazar, Leônidas da Silva, Milton Santos. Nós não teríamos parte do Brasil, e seria um país muito chato”, afirmou.
Em 2015, Juarez foi alvo de ataques racistas nos banheiros da própria universidade da qual, anos depois, se tornaria diretor (entenda abaixo).
O jornalista destacou que sua gestão como diretor estará focada no enfrentamento do racismo acadêmico, que persiste mesmo com as políticas de cotas.
Sua liderança, baseada na ideia da “universidade das possibilidades”, busca formar profissionais e atuar como uma força transformadora, combatendo desigualdades, patriarcado, misoginia e segregação, além de acolher a diversidade em todas as suas formas.
“Quanto mais ampla a universidade, mais capaz ela é de contribuir com a superação da desigualdade. E, ao contribuir com a superação da desigualdade, ela contribui também, penso eu, com a luta contra o patriarcado, contra a misoginia, contra a segregação”, reforçou ao g1.
Carreira
O pai de Juarez era caminhoneiro e foi assassinado nos anos 70. A mãe era empregada doméstica. Juarez trabalhou como ajudante geral em uma fábrica até que ingressou na faculdade de jornalismo, nos anos 80. Segundo ele, foi o primeiro da família a entrar em uma faculdade.
Juarez se formou em jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, com mestrado e doutorado em integração da América Latina pela Universidade de São Paulo (USP).
Professor Juarez Xavier já foi vítima de racismo e fala da Constituição em suas aulas
Reprodução/Globo Repórter
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Hoje, é professor na graduação em jornalismo e na pós-graduação em mídia e tecnologia da Unesp.
Juarez ainda é responsável por projetos de extensão da Unesp, como o Núcleo de Estudos e Observação em Economia Criativa e o projeto Educando para a Diversidade, além de presidir a comissão de averiguação das comissões de pretos e pardos da Unesp.
Vítima de racismo
Mensagens racistas foram escritas em um banheiro da Unesp em Bauru
Juarez Tadeu de Paula Xavier/Arquivo pessoal
Em entrevista ao g1 em 2019, Juarez relembrou alguns episódios de racismo que sofreu durante sua trajetória, desde a graduação até a entrada no meio acadêmico como professor em 2015.
A frase “Juarez macaco” foi encontrada em um dos banheiros da Unesp de Bauru. Na época, segundo o professor, o que mais marcou foi o fato de que as pichações também eram contra mulheres negras.
“Foi a covardia do ato que me marcou. Pichação no banheiro da universidade, com ofensas extensivas às ou aos estudantes e ao pessoal da limpeza. A forma vil e agressiva contra mulheres simples, trabalhadoras braçais”, afirmou na época.
Após as pichações, uma comissão de professores da Unesp foi formada para investigar as frases encontradas no banheiro. Os professores ouviram algumas pessoas durante quatro meses, mas não identificaram os autores.
Professor da Unesp é esfaqueado e diz ter sido vítima de racismo no Dia da Consciência Negra
Reprodução/TV TEM
Outro episódio que marcou o acadêmico ocorreu em 2019, quando, no dia 20 de novembro daquele ano — também o Dia da Consciência Negra —, ele foi atacado a golpes de canivete por um homem aparentemente embriagado.
Durante a discussão, que aconteceu em um supermercado da cidade, o agressor ainda o teria chamado de “macaco”.
O professor foi encaminhado para a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) do Núcleo Geisel, onde recebeu pontos nos dois cortes que sofreu. O agressor foi preso em flagrante.
Professor da Unesp Bauru, Juarez Xavier, é esfaqueado e diz ter sido vítima de racismo no Dia da Consciência Negra
Reprodução/TV TEM
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