A canção ‘Sozinho’ se impõe no roteiro como um dos momentos mais catárticos da turnê dos irmãos. Caetano Veloso no palco da Farmasi Arena, em 3 de agosto, na estreia carioca da turnê com Maria Bethânia
Marcos Hermes / Divulgação
♪ Às vezes, no silêncio da noite, fico imaginando que todo mundo – cantores, compositores produtores musicais, diretores de gravadoras… – pensa que sabe a fórmula do sucesso. Mas, na real, todo mundo a desconhece, e essa é a graça do negócio.
Terminada a primeira etapa da turnê Caetano & Bethânia, dá para cravar – pelas manifestações presenciais e nas redes sociais do público que lotou as quatro apresentações realizadas na Farmasi Arena, no Rio de Janeiro (RJ) – que o número em que Caetano Veloso interpreta a canção Sozinho em set solo é um dos momentos mais catárticos do show.
Na estreia, em 3 de agosto, até integrantes da produção se esqueceram por alguns minutos do trabalho e fizeram coro com Caetano na canção de autoria de Peninha, compositor enquadrado no rol dos autores populares aos quais nunca é permitida a entrada no panteão da MPB pelas elites culturais.
Caetano canta Sozinho com os toques do próprio violão e do violão de Lucas Nunes em registro semelhante à gravação ao vivo lançada em 1998 pelo artista no disco Prenda minha.
Na época, impulsionado pela maciça execução de Sozinho nas rádios, o álbum ao vivo Prenda minha (originado do show baseado no disco Livro, de 1997) se tornou o título best-seller da discografia do cantor, ultrapassando o milhão de cópias vendidas. Um fenômeno inesperado – até porque a canção de Peninha já tinha sido lançada há então somente dois anos por Sandra de Sá em gravação que se tornou o hit do álbum A lua sabe quem eu sou, um dos discos mais aclamados da cantora.
O sucesso da gravação de Caetano prosseguiu ao longo de 1999 com a inclusão de Sozinho na trilha sonora da novela Suave veneno, atração da TV Globo.
Como a vida que ardia em verso da canção Segundo sol (Nando Reis), lançada por Cássia Eller (1962 – 2001) naquele ano de 1999, não tem explicação o sucesso fenomenal de Sozinho na voz de Caetano em 1998. Assim como não tem explicação o fato de, entre cerca de 40 músicas emblemáticas do roteiro do show da turnê Caetano & Bethânia, a força da canção Sozinho se manifestar e se impor mais uma vez em 2024.
Essa força está muito na canção em si, direta e simples como toda boa canção popular. Mas também na interpretação sedutora de Caetano. Ainda assim, não tem explicação. Porque o próprio Caetano Veloso voltou a pisar nesse terreno popular, ao gravar a tristonha canção Você não me ensinou a te esquecer (Fernando Mendes, José Wilson e Lucas, 1978) para a trilha sonora do filme Lisbela e o prisioneiro (2003), e alcançou um sucesso normal.
A canção de Fernando Mendes, aliás, também figura no set solo de Caetano no show com Bethânia. Sozinho é que já nasceu e permaneceu fora do padrão, escancarando que ninguém sabe fabricar um fenômeno. Ele simplesmente acontece. Ou não.