

Centros de reabilitação fecham após denúncias de tortura no Vale do Itajaí – Foto: Reprodução/NDTV RECORD
Dois centros de reabilitação, em Indaial e Timbó, no Vale do Itajaí, foram denunciados por maus-tratos, abandono, trabalho análogo à escravidão, uso excessivo de medicação, más condições de higiene e alimentação, e até casos de morte e abuso sexual envolvendo internos.
As queixas foram feitas por ex-internos do CRAD (Centro de Reabilitação Álcool e Drogas) ao Instituto Movimento Humaniza Santa Catarina, de Florianópolis, que levou o caso ao MPSC (Ministério Público de Santa Catarina). O caso foi apurado pela reportagem da NDTV RECORD.
O CRAD de Indaial está fechado desde o início do ano. Já a unidade de Timbó continua em funcionamento, recebendo novos internos.
O Centro de Reabilitação Álcool e Drogas, de Indaial, e o CRAD C.T. Filhos de Deus, de Timbó, têm CNPJs distintos, mas pertencem ao mesmo casal: Volnei Pereira Gomes e sua esposa.

Centros de reabilitação de Indaial e Timbó pertenciam a um mesmo dono – Foto: Reprodução/NDTV RECORD
Os relatos dos dois centros de reabilitação são das mesmas irregularidades, principalmente sobre o trabalho forçado, que era chamado de “laborterapia” por Volnei.
“Eles dizem que é laborterapia, mas a gente era obrigado a ficar o dia inteiro com os cavalos, e quem não obedecia apanhava”, relata um dos ex-internos.
“Os internos pagavam para trabalhar para o dono da clínica. E o trabalho não era opcional, era obrigatório, sob pena de castigos físicos, psíquicos ou de serem drogados e trancados em seus dormitórios”, diz a denúncia feita ao MP.
Instituto descreve CRADs como ‘circo de horror’

CRAD de Indaial fechou as portas após vistoria do MP – Foto: Reprodução/NDTV RECORD
Alimentação estragada, dopagem forçada, trabalho sem remuneração e castigos físicos. Esses são alguns dos abusos denunciados por ex-internos dos centros de reabilitação interditados em Indaial e Timbó. Os relatos, reunidos pelo Instituto Movimento Humaniza SC desde o fim de 2023, revelam um cenário de violações graves.
“A primeira vez que fui internado foi à força. Eu tava dormindo, aí me acordaram de madrugada, um cara me deu um mata-leão e me levaram”, conta um ex-interno do CRAD de Timbó.

Ex-interno foi levado á força para CRAD de Timbó – Foto: Reprodução/NDTV RECORD
Segundo Ideli Salvatti, presidenta do Instituto Movimento Humaniza Santa Catarina, os denunciantes não se conheciam, mas descreveram práticas semelhantes: uso excessivo de medicamentos, falta de atendimento médico, castigos psicológicos e isolamento.
Muitos internos eram obrigados a trabalhar na limpeza da clínica, no preparo da comida e até em um haras que pertence ao dono do espaço — tudo sem qualquer remuneração.
Durante a noite, os internos ficavam trancados em quartos sem acesso ao banheiro. Em alguns casos, urinavam e defecavam nos colchões. Também foram relatadas mortes e tentativas de suicídio dentro das unidades. A alimentação, segundo os relatos, vinha do descarte de supermercados.
Veja imagens dos centros de reabilitação de Indaial e Timbó
Centros de reabilitação: entenda as diferentes classificações
Existem duas modalidades reconhecidas para o tratamento de dependência química:
- Comunidades terapêuticas, que oferecem acolhimento voluntário e foco na convivência.
- Clínicas especializadas, que permitem internação voluntária ou involuntária, sob responsabilidade médica.
Segundo o MDS (Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social), os CRADs não se enquadram em nenhuma dessas categorias, por não cumprirem os requisitos mínimos exigidos pela Anvisa. As denúncias apontam práticas como internação forçada e uso irregular de medicamentos.
Na terça-feira (06), a Justiça mandou fechar um centro de reabilitação em Paulo Lopes, na Grande Florianópolis, também por práticas de tortura.
Investigações
Após as denúncias, o MPSC (Ministério Público de Santa Catarina) abriu um inquérito civil para investigar o caso. O processo permaneceu em sigilo até o início de março, quando foi realizada uma inspeção na unidade de Indaial.

MPSC abriu inquérito para apurar denúncia sobre centros de reabilitação – Foto: MPSC/ND
Após a fiscalização, os diretores do centro de reabilitação decidiram fechar a entidade, alegando problemas financeiros e a impossibilidade de cumprir todas as exigências feitas pela vistoria. Isso indica que o funcionamento irregular da unidade pode ter ocorrido por um longo período.
Agora, o Ministério Público vai investigar como os internos retornaram às suas famílias. A promotoria responsável pelo caso preferiu não conceder entrevista.
A Prefeitura de Timbó informou que a vistoria do CRAD da cidade foi realizada pela Justiça, e o processo segue em segredo.
O que diz o proprietário dos centros de reabilitação
Em entrevista à NDTV RECORD, Volnei negou todas as acusações e afirmou que as denúncias são mentiras inventadas por um grupo de ex-internos.
“Ninguém consegue sustentar uma mentira por tanto tempo. A verdade vai prevalecer” — Volnei Gomes
O proprietário confirmou a visita surpresa realizada pelo MPSC para vistoriar o local. “A visita técnica não constatou nenhuma irregularidade”, declarou Geremias da Silva Padilha, advogado dos centros de reabilitação.