Cerca de 70% dos corais de fogo da costa norte do RN morreram nos últimos cinco anos, aponta pesquisador


Aquecimento do mar e turismo desordenado são as principais ameaças aos corais. Aquecimento do mar e turismo desordenado causam riscos para recifes de corais no RN
Uma das principais barreiras de corais da costa do Rio Grande do Norte enfrenta riscos como o desaparecimento de espécies. Cerca de 70% dos corais de fogo que existiam na região entre os municípios de Rio do Fogo, Touros e Maxaranguape, morreram nos últimos cinco anos, de acordo com o pesquisador Guilherme Longo, que estuda a vida marinha na região.
A região faz parte da Área de Proteção Ambiental dos Recifes de Corais (APARC), que tem 1.360 quilômetros quadrados monitorados pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte (Idema).
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Outros animais da área, como o peixe budião azul – comum em áreas de recifes corais, praticamente não são mais vistos na região.
O aquecimento do oceano é o principal fator de enfraquecimento dos recifes de corais na costa potiguar, mas as ações diretas do ser humano, como o turismo desordenado, também intensificam o processo e causam preocupação às autoridades locais.
Os recifes de corais são considerados as florestas do oceano. São habitats de muitas espécies, algumas delas com alto risco de extinção, além de importantes atrações turísticas e inclusive fonte de pesquisas para produção de medicamentos.
De acordo com o biólogo e professor Guilherme Longo, do Departamento de Oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), os recifes de corais da costa potiguar passaram por pelo menos dois processos de branqueamento nos últimos cinco anos: um em 2020 – mais forte – e outro em 2024.
O branqueamento é sinal de que algo está errado: ele acontece quando a água do mar está mais quente.
O pesquisador aponta que o processo é natural, causado pelas ondas de calor da água do oceano – assim como acontece na terra – porém tem se tornado cada vez mais frequente, deixando menos tempo de recuperação dos corais.
“Essas ondas de calor aconteceriam naturalmente uma vez a cada 10 anos, ou uma vez a cada 15, mas, como o ser humano está contribuindo muito nas mudanças climáticas, isso está acontecendo a cada dois anos ou, às vezes, até anualmente”, disse o pesquisador.
O que é o branqueamento
Processo de branqueamento dos corais
Arte g1
A coloração dos corais é causada pela presença de microalgas, com as quais eles se “associam”. As microalgas ficam protegidas dentro no tecido do coral e, em contrapartida, dividem com ele a energia que produzem por meio da fotossíntese. “Grande parte na nutrição do coral vem dessas algas”, diz Guilherme Longo.
Porém, quando a água do mar esquenta, o processo de fotossíntese aumenta, causando a presença de muito oxigênio, o que causa o estresse oxidativo.
“É igual quando a gente coloca água oxigenada no lugar machucado que dá aquela ardida. Começa a acontecer isso dentro do coral. Então o coral expulsa essas algas. Por isso ele fica transparente e a gente vê o esqueleto branco através do tecido”, afirma o pesquisador.
De acordo com o professor, o processo é grave porque a maior parte da nutrição dos corais vem das algas e, portanto, eles ficam com fome e, portanto, suscetível a doenças e outros riscos. “É um período muito frágil assim pros corais”, complementa.
O branqueamento dos corais também atinge outros estados da costa brasileira, como Pernambuco e Alagoas.
70% dos corais de fogo da costa norte do RN sumiu nos últimos cinco anos
Jéssica Bleuel/Cedida
Corais de fogo são os mais afetados
Após o período de aquecimento, os corais podem se recuperar e voltar a receber as algas, porém, muitos não resistem.
É o caso do coral de fogo – o Millepora alcicornis – um coral ramificado, com formato de “árvore”, que dá muita complexidade pros peixes se esconderem.
“É um dos primeiros a ficar branco, perto de 100% da população branqueia e cerca de 95% infelizmente não resiste. Então essa é uma espécie que a gente via bastante e agora infelizmente quase não vê”, diz Guilherme Longo.
Por outro lado, o coral estrela – Siderastrea stellata – o mais abundante e principal construtor dos parrachos na região de Touros, Rio do Fogo e Maracajaú, chega a registrar um branqueamento de cerca de 95% da população, mas a taxa de mortalidade fica abaixo de 5%.
O branqueamento ocorre com o aumento da temperatura da água, que sai da média de 28º C e, por vezes, chega aos 32º C. Segundo o professor da UFRN, os corais da região de Touros, Rio do Fogo e Maxaranguape são os mais afetados, pois estão em águas rasas, mas em 2020 os pesquisadores chegaram a encontrar branqueamento em corais a 30 metros de profundidade.
No ano passado, os pesquisadores identificaram o pico de temperatura entre março e maio. Os primeiros sinais de recuperação dos corais foram vistos em julho, mas o sistema só se estabilizou completamente em setembro.
Turismo irregular também preocupa
Passeio nos parrachos do litoral Norte potiguar
Ricardo Junqueira/Idema/Divulgação
Os corais de Maracajaú, Touros e Rio do Fogo estão dentro da Área de Proteção Ambiental dos Recifes de Corais (Aparc) criada em 2001 e administrada pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte (Idema).
Com uma área de mais de 136 mil hectares, ou 1.360 quilômetros quadrados, a unidade ambiental tem objetivo de assegurar a preservação da biodiversidade marinha com a ocorrência de recifes de corais, ao mesmo tempo em que permite práticas turísticas e econômicas, como de mergulho submarino, visitação a bancos de corais, pesca artesanal e pesquisas científicas.
De acordo com a gestora da unidade de conservação, Jaciana Barbosa, um fator que tem preocupado o órgão é a atuação de embarcações irregulares que levam dezenas de turistas diariamente para os parrachos. A visitação na área é regulamentada e, teoricamente, só pode ser feita por empresas registradas.
“A gente tem essas embarcações clandestinas que vão todos os dias pros parrachos e o Idema, sozinho, não consegue o controle dessas embarcações. Então, o que a gente está tentando fazer na gestão é somar esforços com outras instituições, como policiamento ambiental, Capitania dos Portos, para poder conseguir pelo menos ordenar minimamente, para que o impacto não seja tão grande”, considera.
Animais vivem nos corais do litoral potiguar
Jaciana Barbosa/Aparc/Idema
Para a gestora da unidade de conservação, embora o branqueamento seja causado por um processo natural e em escala global, as ações humanas também podem causar efeitos localmente. Ela ressalta, por exemplo, que o coral de fogo desapareceu completamente das áreas visitadas, enquando ainda são encontrados, embora em pequena proporção, nas áreas de preservação total.
“O fato de a gente ter mais pessoas nos parrachos também intensifica o prejuízo, tanto no sentido mecânico mesmo, das pessoas pisarem nos corais, como também, o aumento da temperatura. Quanto mais pessoas você tem num determinado local, a temperatura da água também vai estar maior naquele local. Então, indiretamente, o turismo desenfreado vai afetar os corais”, afirma.
Em março de 2024, o Idema notificou mais de 50 embarcações turísticas irregulares para que parassem de fazer passeios na região.
Em setembro de 2024, duas turistas morreram em após uma das embarcações atuadas, que continuava operando passeios na região, afundar. Após o caso, o Idema suspendeu temporariamente os passeios na região.
Calor intenso do ano passado provocou mortandade sem precedentes de corais brasileiros
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