Toques físicos, viagens e convites para academia: veja relatos de alunas sobre professor da USP acusado de assédio sexual


Após processo administrativo disciplinar, docente do Departamento de Química, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, em Ribeirão Preto (SP), foi afastado por 180 dias. Ele foi procurado, mas não se manifestou sobre as acusações. Departamento de Química da USP Ribeirão Preto
Jefferson Severiano Neves/EPTV
Duas ex-alunas do professor José Maurício Rosolen, afastado das atividades no campus da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto (SP), relataram ao g1 diferentes episódios de assédio que sofreram entre 2021 e 2024, enquanto eram alunas dele.
Apesar de os relatos serem de anos diferentes, apresentam semelhanças no comportamento do professor. As duas vítimas, ex-alunas de pós-doutorado, preferiram não se identificar, mas revelaram que passaram por contatos físicos inapropriados, convites inconvenientes, além de episódios de assédio moral após a negativa por parte delas. (veja os relatos mais abaixo)
Siga o canal g1 Ribeirão e Franca no WhatsApp
Rosolen foi afastado das atividades no Departamento de Química da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) após apuração preliminar. Um processo administrativo disciplinar, instaurado em setembro de 2024, determinou o afastamento por 180 dias.
De acordo com uma outra denunciante, que também prefere não se identificar, uma lista com ao menos 16 mulheres que passaram por assédio foi enviada para a comissão responsável pelo processo administrativo disciplinar. No entanto, ela não sabe ao certo quantas vítimas foram realmente ouvidas.
O g1 procurou Rosolen para pedir um posicionamento, mas, até a última atualização desta reportagem, não havia obtido um retorno.
Também procurada, a Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP/SP) informou que não existe investigação contra Rosolen por parte da Polícia Civil. A pasta disse ainda que não foi localizado nenhum boletim de ocorrência registrado contra o professor.
Veja abaixo os relatos:
‘Colocava a mão na minha perna, algumas vezes, carinho na mão’
Uma das ex-alunas de pós doutorado, em entrevista ao g1, lembra que o primeiro contato presencial que teve com o professor foi em maio de 2024. Antes disso, as conversas eram feitas todas por vídeo.
“Logo na primeira semana já começaram umas coisas muito esquisitas, alguns comportamentos inadequados. Ele me chamando para fazer ginástica com ele na USP, me cobrando para ir com roupa de ginástica”.
Pouco tempo depois, Rosolen a convidou para um musical especial de Dia dos Namorados. Os convites foram ficando cada vez mais frequentes, mesmo com as negativas dela.
A ex-aluna lembra também do dia em que o professor a convidou para uma viagem para Grécia, para visitar um fornecedor do estudo que eles trabalhavam na época. O docente informou que apenas os primeiros dois dias seriam de trabalho e depois eles poderiam passear.
“Nessa época, minha bolsa [de estudo] ainda não tinha caído e daí ele falou ‘eu sei que você ainda não tem bolsa, eu consigo pagar sua passagem com o dinheiro do meu projeto, mas eu não tenho dinheiro para pagar diária pra você. Mas não tem problema, porque a minha diária como professor é muito boa, eu pego um quarto de hotel e a gente divide, eu sou solteiro, você é solteira, não vejo problema nenhum’.”
Vista do lago da USP de Ribeirão Preto (SP)
Carlos Rocha/Arquivo pessoal
A ex-aluna conta que desde o começo se sentiu acuada, principalmente, porque estava cara a cara com o professor e afirmou que, mesmo sem o dinheiro da bolsa de estudos, poderia dar um jeito de pagar um quarto separado. No fim, a viagem acabou não acontecendo.
Ainda no mesmo dia do convite para a viagem, começaram os ‘contatos físicos’. Ela lembra que precisava levar uma peça de metal para a oficina, que fica afastada do laboratório onde estavam.
“Depois dessa conversa da Grécia, eu estava bem desconfortável e sabia que eu ia ter de ir de carro com ele. Eu passei no laboratório para pegar a peça, olhei para os meus colegas e convidei para ir com a gente na oficina, já que eles eram novos ali. O professor cortou e falou ‘não, vocês ficam, o que vocês estão fazendo é mais importante, vai só eu e ela’.”
A ex-aluna conta que os colegas eram dois homens que também faziam pós-doutorado com Rosolen e já sabiam que tinha algo ‘estranho’ acontecendo, porque comentou com eles sobre o convite que recebeu para a ir à academia.
“Eu fui quase saindo pela janela, porque eu estava nervosa. Quando chegou no estacionamento da oficina, ele foi me mostrar o que queria fazer na peça, era uma peça grande, comprida, que eu estava segurando. Em vez de ele apontar para o que queria fazer, ele colocou a mão dele sobre a minha, fez um carinho. Eu já fiquei nervosa, comecei a chorar, pensei em desistir”.
Mesmo após o episódio, os toques continuaram. O último que a ex-aluna lembra foi quando os dois estavam no laboratório, ela escrevendo um artigo no computador e ele ao lado, corrigindo um projeto.
O docente, de acordo com ela, começou a colocar a mão na perna dela e fazer carinho na mão. Foi nesse momento, que a ex-aluna reagiu e outro tipo de assédio começou.
“A partir desse momento que ele se sentiu rejeitado, começaram alguns assédio morais. Ele já fazia isso com os meninos, ele ofende, não diretamente, mas faz fofoca de um para outro, tenta colocar um contra o outro, fala que o outro não sabe nada, que é burro. Os dois colegas são homossexuais, ele faz piadas de cunho homofóbico, ameaçava cortar a bolsa, fazia muita ameaça com todo mundo”.
‘Ele gostava de tocar em lugares que não precisava’
Ao g1, outra ex-aluna de pós-doutorado comentou sobre situações semelhantes que passou enquanto convivia com Rosolen.
“Eu trabalhei em 2021 e 2022. Ele gostava muito de tocar em lugares que não precisava tocar, passar por você e tocar em você, ele gostava de tocar na cintura, gostava de uma aproximação maior”.
De acordo com a ex-aluna, o docente tem uma ‘fama’ na faculdade por conta desses comportamentos. Mesmo sem saber disso, logo de início comentou que tinha um namorado, o que, segundo ela, pode ter minimizado os episódios de assédio.
Acordo tácito
Ainda com todo o cuidado que existia entre os alunos, não era suficiente para inibir episódios de assédio, lembra a ex-aluna.
“A gente tinha um acordo tácito, de não deixar mulheres sozinhas com ele no laboratório. Teve uma vez que estavam só eu e um outro rapaz, também pós-doc, e o Rosolen pediu para ele buscar alguma coisa, só que não explicou direito o local e eu acabei ficando com ele uns 15 minutos. Quando esse pós-doc voltou, ele [o professor] estava quase no meu colo”
A ex-aluna diz que, apesar das situações difíceis que passou com o docente, outras alunas que conhece passaram por casos mais graves.
*Sob a supervisão de Flávia Santucci
Veja mais notícias da região no g1 Ribeirão Preto e Franca
VÍDEOS: Tudo sobre Ribeirão Preto, Franca e região
Adicionar aos favoritos o Link permanente.

Os comentários estão desativados.