Mais que IMC: especialistas propõem reformulação de diagnóstico da obesidade


Nem sempre pessoas com excesso de gordura corporal têm um IMC que indique obesidade. Revisão também prevê duas novas categorias para realização do diagnóstico: obesidade clínica e obesidade pré-clínica Nem sempre pessoas com excesso de gordura corporal têm um IMC que indique obesidade
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A definição de obesidade não deve mais depender somente do índice de massa corporal (IMC). Também é necessário considerar as medidas de gordura corporal para evitar o risco de classificações incorretas de obesidade.
Isso é o que propõe a Comissão sobre Obesidade Clínica, formada por 56 especialistas de todo o mundo, em sua nova publicação na revista científica “The Lancet Diabetes & Endocrinology”. O grupo defende uma grande reformulação no diagnóstico de obesidade, indo além do IMC.
📍O índice de massa corporal (IMC) é o peso em quilos dividido pela altura ao quadrado. Entre 25 e 29,9 é considerado sobrepeso. Se for superior a 30 é considerado obesidade.
“Confiar apenas no IMC para diagnosticar obesidade é problemático, pois algumas pessoas tendem a armazenar excesso de gordura na cintura ou em torno de seus órgãos, como o fígado, o coração ou os músculos, o que está associado a um risco maior à saúde”, explica Robert Eckel, professor de medicina na Universidade do Colorado e membro da comissão.
➡️A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que mais de um bilhão de pessoas são afetadas pela obesidade no mundo. Um relatório de 2024 mostra que a epidemia está presente não só entre adultos como entre crianças e adolescentes.
Eckel ainda completa que nem sempre pessoas com excesso de gordura corporal têm um IMC que indique obesidade – fator que pode agravar problemas de saúde.
A revisão também prevê duas novas categorias para realização do diagnóstico (entenda mais abaixo):
Obesidade clínica
Obesidade pré-clínica
Limitações do IMC
Ainda que seja reconhecido como um método para identificar pessoas que podem estar vivendo com obesidade, os especialistas há tempos questionam o IMC como critério para definir a doença.
Isso porque a conta simples foi projetada para caracterizar populações e não para ser aplicada individualmente.
Além disso, diversos fatores podem afetar o peso e a saúde de uma pessoa – e isso não necessariamente estará refletido no resultado apresentado pelo índice.
“Embora o IMC seja útil em estudos populacionais, ele não é suficiente para avaliar a saúde individual. Medidas adicionais, como da circunferência abdominal e exames de composição corporal, também são importantes para uma avaliação mais precisa”, defende Paulo Miranda, coordenador da Comissão Internacional da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
A comissão também destaca que o IMC não exige uma medida direta de gordura, sendo incapaz de mostra sua distribuição ao redor do corpo e de fornecer informações sobre a doença de forma mais personalizada.
➡️Considerando as limitações do índice, os especialistas sugerem que a confirmação da obesidade utilize os seguintes métodos:
Ao menos uma medição do tamanho corporal (circunferência da cintura, relação cintura-quadril ou relação cintura-altura) em complemento ao IMC;
Ao menos duas medições do tamanho corporal (circunferência da cintura, relação cintura-quadril ou relação cintura-altura), independentemente do IMC;
Medição direta da gordura corporal (como por meio de densitometria óssea ou DEXA), independentemente do IMC;
Em pessoas com IMC muito alto, pode-se assumir a presença de excesso de gordura corporal.
Novas categorias de obesidade
Além de apresentar uma nova abordagem para o diagnóstico, a publicação também apresenta duas novas categorias de obesidade: obesidade clínica e obesidade pré-clínica.
Obesidade clínica
Condição associada a sinais ou sintomas de prejuízo no funcionamento de órgãos ou de redução da capacidade de realizar atividades diárias (como tomar banho, se vestir, comer, entre outros).
👉Entre os critérios estabelecidos para a confirmação da obesidade clínica estão:
Falta de ar
Insuficiência cardíaca
Dor nos joelhos ou quadris, com rigidez articular e redução da amplitude de movimento
Alterações ósseas e articulares em crianças e adolescentes que limitam o movimento
Outros sintomas causados por disfunções de órgãos como rins, sistema nervoso, urinário, reprodutivo e vias aéreas superiores
Aqueles que são diagnosticados com obesidade clínica devem ser consideradas portadoras de uma doença clínica.
Obesidade pré-clínica
Quadro que se caracteriza pela função normal dos órgãos.
Ou seja, pessoas vivendo com obesidade pré-clínica não apresentam nenhum tipo de doença, embora tenham um risco maior de desenvolver obesidade clínica, além de outras doenças crônicas, como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, alguns tipos de câncer e transtornos mentais.
Por isso devem realizar um acompanhamento médico para reduzir o risco de possíveis doenças.
75% dos adultos brasileiros terão obesidade ou sobrepeso em 20 anos
Aprovação dos especialistas
Endocrinologistas brasileiros apoiam o documento e apontam que ele traz uma visão maior sobre a doença.
“É uma tendência que já vem sendo proposta há alguns anos pontualmente em diversas partes do mundo. Uma visão não focada apenas no índice de massa corporal, que por anos foi o único critério de diagnóstico”, aponta Paulo Miranda, da SBEM.
Para Miranda, a nova proposta coloca a obesidade no centro, não apenas como um fator de risco, mas como uma doença base para o desenvolvimento de outras complicações.
Bruno Halpern, vice-presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso) e presidente eleito da Federação Mundial de Obesidade, acredita que a nova classificação pode melhorar o diagnóstico e ampliar o acesso a tratamentos no SUS.
“É uma abordagem mais científica e humanizada, que valoriza o contexto individual e combate a ideia de que obesidade é uma questão apenas de força de vontade”, diz.
Ricardo Cohen, head do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, membro da Comissão sobre a definição de obesidade clínica e atual Presidente Mundial da IFSO (Federação Internacional de Cirurgia da Obesidade e Distúrbios Metabólicos), acredita que os conceitos de obesidade clínica e pré-clínica ajudarão em um diagnóstico mais preciso sobre a doença.
“Essa nova classificação contribui para o planejamento de estratégias de saúde pública e o desenvolvimento de políticas mais eficazes e baseadas em evidências científicas. Ela também assegura que os tratamentos sejam mais direcionados e personalizados. Dessa forma, garantimos que cada indivíduo receba o cuidado que realmente necessita, livre de julgamentos ou culpas”, afirma Cohen.
Hoje, mais da metade dos adultos brasileiros têm obesidade ou sobrepeso, segundo dados do IBGE. Um estudo feito em 2024 apontou que, se nada for feito, 48% dos adultos brasileiros (com mais de 18 anos) viverão com obesidade e outros 27% estarão com sobrepeso, totalizando 75% dessa população.
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